sábado, 22 de março de 2008

Os besouros de Liverpool

O que foi mesmo que os Beatles inauguraram? Não foi o rock, que já era bem velhinho quando os meninos de Liverpool começaram já nos entrando dos 60. Seria isso que virou, para além do rock, e que passou a ser chamado de pop? Também não, os garotos merecem mais que isso. Ou foram os meninos o primeiro exemplo da coisa midiática que hoje consome celebridades com apetite digno do gigante Piamã de Macunaima? Seja lá o que for, eles entraram puramente na brincadeira, com a desculpa dos primeiros que não faziam a menor idéia e a inocência de uma virgindade discursiva que ajudaram a deflorar.
Mas aqueles são os Beatles de outros tratados, de outra História. Eu, por aqui, continuo interessado na minha historinha comum, ou, na suposiçao de um certo leitor que me movimenta o contador, uma história em comum. Eu, pretenciosamente, me suponho cavalo dos meninos e meninas que um dia fomos, depois do rock, durante os Beatles, atravessados pelo pop, e atônitos frente a mídia enlouquecida, meio sem saber onde foi parar tanta coisa e onde tantas outras irão acabar. Pois os tempos que os Beatles inauguraram é esse, onde as coisas acabam não muito depois de começar.
Mas, de novo, chega de sociologia. Vamos de volta aos Beatles e eu. Menino bossa-nova, festivamente à esquerda naqueles tempos em preto e branco, aquela música vinda lá do centro do Império do Mal, não foi recebida por mim com os braços exatamente abertos. Além do mais, romântico, sempre temperado por uma certa melancolia, a música dos Beatles, em letras que não entendia, eram meio alegres demais, frenéticas demais, vivazes demais. Tanto que o primeiro Beatles que me lembro admitido foi essa balada, quase langorosa, que eu e Nina trocamos como nossa.
Aliás, foi com Nina, que ao contrário de mim não era sujeita ao bom mocismo de esquerda que me engessava as confissões, que eu, meio escondido no escurinho do namoro, me permiti escutar vários estrangeiros da época como The Monkeys, The Mamas & The Papas e outros tantos. E tudo isso tendo ao fundo os ecos mais raivosos de Janis Joplin e Jimmy Hendricks que a vitrola do cunhado berrava do outro lado do portão (links para vídeos no YouTube).
Mas a minha rendição final aos Beatles se deu, junto com Nina e Igino, cunhado e amigo, na Rua da Paz em Santos, casa de Regina, namoradinha do Igino. Ano incerto, que eu poderia precisar pesquisando um pouco não fosse minha incurável preguiça. Mas foi o ano do lançamento do disco Sargent Pepper´s Lonely Hearts Club Band (vai ver foi meu coração solitário que fez, finalmente, que eu me juntasse ao clube). With a little help from my friends, eu me dei, definitivamente, o direito de gostar daqueles maluquinhos e a buscar, de vez em quando, diamantes no céu. Daí para frente foi uma frenética tentativa de recuperar o tempo perdido comprando os LP´s mais antigos, curtir o Album Branco, Abbey Road, etc.
Depois foi acompanhar as tensões que começaram a se criar no grupo, ter raiva da pobre da Yoko, até ter meus (nossos) sonhos adolescentes assassinados com John no dia 08 de dezembro de 1980. A morte de John Lennon tornou os sonhos mais difíceis de serem imaginados. O mundo que os Beatles inauguraram em cantoria havia crescido tanto que teve que matar o menino que ainda esperneava e resistia. O sonho havia acabado. Acordávamos para a modernidade yuppie, para a roda viva da obselescência programada, para a metonímia maluca dos pequenos desejos que nos sujeitam.
Restava viver, e nesse sentido, crescemos (alguns) com a morte dos Beatles (que morreram definitivamente com John, mesmo que já tivessem se desmanchado antes; agora não era mais possível sonhar com o retorno da banda de nossa adolescência tardia). Mas tudo havia se tornado mais chato. Havia que descobrir outros sonhos, mas agora com a certeza de que tudo é ilusão e só nos cabe escolher as de nossos desejos, solitários como são essas coisas do desejo.
Depois de muitos anos, estou quase aprendendo a escolher só as engraçadinhas, como me desejou Gilza um dia. Só espero não fazer como o cavalo do inglês que, quando estava quase aprendendo a viver sem comer, morreu.
Mas confesso, essa música que aqui posto, foi minha última "nossa música" com minha última namoradinha, apesar de não ter faltado "nós" em minha vida, nem músicas. Mas as músicas agora eram "marcantes", e cada um de meus encontros, e despedidas, amorosos teve lá sua série delas.

Mas, chega de conversa e vamos à música que aqui tem endereço em rendição certeira.

PS. Todos os links da postagem remetem a vídeos do YouTube relacionados com o artista e/ou album em questão. Abram-nos em outra aba nos seus navegadores, e o post vira a mais longa viagem musical que por aqui postei.

3 comentários:

Anônimo disse...

UMA MÚSICA POR DIA nem precisa. Se a beleza de cada uma delas for muita, como estas que voce escolheu, vão ressoar durante uns 2,3 dias.

Parabéns !

Cristina

Anônimo disse...

Eu me apaixonei pelos Beatles logo na primeira 'ouvida', coisa rara de acontecer e acho que essa paixão vai durar a vida inteira. A musica era "I want to hold you hand".
Também me apaixonei pela Billie Holliday, pelo Cole Porter e alguns outros que agora dormitam à espera de serem chamados para o primeiro plano outra vez.

Obrigada Zé !

Anônimo disse...

Que bom a gente ser desta safra! Sempre rejuvenescidos pela boa música.

Muito bom.

Beijo

Meire