quarta-feira, 30 de maio de 2007

Tudo que eu sempre quis dizer aos meus alunos, e nunca disse.





"Bem ... Freud nos diz, repetidamente, que a sublimação é também satisfação da pulsão, sendo que ela ... é inibida quanto a seu alvo... ela não o atinge. A sublimação é, entretanto, satisfação da pulsão, sem recalque. Em outras palavras, no momento eu não estou trepando, estou falando para vocês. Bem! Eu posso ter exatamente a mesma satisfação como se estivesse trepando ... e isso levanta a questão se, de fato, eu estou ou não trepando nesse momento"

J. Lacan, Seminário 11

terça-feira, 29 de maio de 2007

Diferença e Repetição




"...ao escrevermos, como evitar que escrevamos sobre aquilo que não sabemos ou que sabemos mal? É necessariamente neste ponto que imaginamos ter algo a dizer. Só escrevemos na extremidade de nosso próprio saber, nessa ponta extrema que separa nosso saber e nossa ignorância, e que transforma um no outro... Suprir a ignorância é transferir a escrita para depois ou, antes, torná-la impossível."


Giles Deleuze, Diferença e Repetição, Graal, 1988, p. 18



Infanto juvenil


Têm dias que acordo morto,
têm outros que desperto vivo.
Têm noites que me sonho torto,
têm noites que sou só sorrisos
Duras são as tardes,
que ardem,
sem copos de chuva,
sem taças amantes,
sem cálices de risos.
.EE passam,
sem maior alarde,
entreato fútil,
vida inútil,
que sonha que acorda
e dorme antes que tarde.

Lembraram de mim



Para Marco Aurélio, que nunca se esquece de mim

Movimento

.
.
.
.
.
.



E assim me alegro,
ma non troppo,
de bar em bar,
onde me entrego,
assaz allegro,
perto do copo.




Em casa, ainda 28/05/07, 0ficialmente 29, o que, noves fora, é o vinte que a gente quiser.

Cotidiano






Mas resta,
aberta,
a janela besta
que ela deixou desperta

Todos os dias

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Carne a-dentro

Para Gilza, que não quero ter perdido em vão.
Do Frango às coxas,
destas às moças,
uma história tonta
que aqui se conta.
Mas verá o leitor
que no fim de tudo,
resta um amor
obrigado mudo.
..
.
Vou abandonar o Frango
pelas coxinhas.
Espero que, lá, o rango,
quer dizer, galinhas,
se demonstrem mais dignas
desta troca ousada,
e me espetem insígnias
pela decisão tomada.
Abandono os machos,
frangos, frangotes,
para me gastar no escracho
dos meus velhos botes.
Quero coxas, coxões e sobrecoxas,
para fazer valer, enfim,
esta coisa roxa
que cacareja em mim.
Adeus Frango querido,
benvinda Coxinha minha!
Salve, salve, minha outra vida,
reapareço, desaparecido!
logo ali, numa outra esquina,
da sempre mesma pracinha.
Ali beberei as cevas que acolá eu tinha,
esquecerei os machos que por lá dormiam,
e far-te-ei Pasárgada, Coxinha minha,
ao encontrar as frangas que me comiam.
Do Frango a ti, será que errei?
Mas se és Pasárgada,
lá sou amigo do rei,
que mulheres me guarda,
e escolherei.
Delirante em ato,
só por escolha,
evito o farto, e o fato
de que esta outra bolha,
é fogo fátuo
de meu desejo errante.
Mas sigo adiante,
para além do Frango
uma Coxinha me espera.
Cansei do tango,
viva a quimera!
E do Frango às coxas,
e da suposta ousadia,
resto sem dança,
fico sem moças,
me agarro à lembrança
da anatomopatologia.
E por aqui eu resto e fico,
índio na oca,
com o dela Tico,
meu São Pipoca.
E só falta um nada
para ser Seu Zé
e retomar minha trilha;
é o Zé Mané
e a Sacra Família.

Bar da Coxinha, 28/05/07

Cordel filosófico





Sócrates, velho biruta,
para falar de verdade,
dançou e tomou cicuta.
Já Einstein, gênio novo,
provou a relatividade,
e mostrou a língua pro povo.

O buraco que somos se segura nas mal traçadas linhas que nos circun-escrevem.


Estava eu limpando minha caixa de entrada de mails quando, bem lá no comecinho dela, reli esse texto, de Contardo Caligaris, que um dia, remotamente passado, Anninha havia mandado para a turma. Apesar de toda a psocologia nele estampada, ecos dos tempos americanos do autor e cacoete que tem desde que o escutei pela primeira vez lá pelo início da década de 90, a questão se sustenta, mais além um pouco da questão da depressão. O que nos é tirado, ou acrescentado, nos muda, e nem sempre para melhor. As doenças me marcam até hoje, me entristeceram no um pouco de vida que me tiraram; o cigarro, com quem resolvi enfrentar luta feroz, tenta se defender de meus propósitos, não tão firmes, que em minha idade nada mais tem a firmeza de outrora, me convencendo que serei outro. Mas tirando o cigarro, e assim mesmo não sei não, a questão colocada no artigo se sustenta. Vai para o blog ou não vai?

É possível estar mal e pensar direito?
Uma das questões mais interessantes da psicologia das últimas décadas é a seguinte: em que medida o sofrimento psíquico de um sujeito deve ser relacionado com um defeito de sua percepção e de seu entendimento do mundo? Obviamente, a pergunta é relevante só quando o sofrimento é uma condição severa e duradoura.
Tomemos, por exemplo, a depressão, um estado patológico que, em princípio, não nos torna delirantes nem alucinados. "Ser" depressivo (diferentemente de "estar" deprimido) significa passar, ao longo da vida, por vários episódios de depressão profunda e sofrer de uma constante dificuldade em encontrar a vontade de viver.
Pois bem, será que ser depressivo implica (como causa ou como efeito) um erro de percepção e de pensamento? Qualquer terapeuta gostaria que fosse assim: bastaria corrigir o erro e, com isso, quem sabe a depressão fosse "curada". Se você é depressivo e enxerga o mundo como a brincadeira sádica de um deus maléfico, talvez você seja vítima dessa visão "errada". Ao corrigi-la com as palavras certas, a gente transformaria seu humor de vez, faria de você outra pessoa. Mas sobra a pergunta: será mesmo que, por você ser depressivo, sua percepção do mundo está errada?
Em 1979, foi publicada uma experiência (Abramson e Alloy, "Journal of Experimental Psychology", vol. 108, nº 4), na qual dois grupos de sujeitos (os deprimidos e os "saudáveis") deviam descobrir se suas ações tinham ou não alguma influência sobre uma lâmpada que, de fato, se acendia e se apagava ao acaso. Os não-deprimidos, apesar dos desacertos, concluíram que suas ações eram eficazes. Os deprimidos concluíram (corretamente) que suas ações não tinham eficácia nenhuma e que não havia como fazer a cabeça da maldita lâmpada.
Para alguns críticos, a experiência demonstrava apenas o pessimismo dos deprimidos. Mas resta que, no caso, a conclusão dos deprimidos foi certeira; portanto caberia salientar o extravagante otimismo que extraviou os não-deprimidos e constatar o realismo dos deprimidos. Aliás, a questão levantada pela experiência de 79 entrou para a história da psicologia como problema do "realismo depressivo" (há novas experiências publicadas no recente vol. 134 do "Journal of Experimental Psychology").
O interesse desse debate não é só clínico. Acaba de sair um livro imperdível, "Lincoln's Melancholy: How Depression Challenged a President and Fueled His Greatness" (a melancolia de Lincoln: como a depressão desafiou um presidente e alimentou sua grandeza), de Joshua Wolf Shenk.
Shenk se baseia nos relatos dos que foram próximos de Abraham Lincoln para confirmar que ele foi clinicamente deprimido durante a vida toda. Logo, o autor se pergunta se essa depressão grave e crônica constituiu um impedimento ou se, ao contrário, foi uma vantagem na conduta do presidente americano durante a Guerra de Secessão.
Ora, Shenk argumenta de maneira convincente que a depressão de Lincoln foi responsável por suas qualidades de estadista. A seguir, alguns exemplos:
1) A depressão clínica é sempre acompanhada por um intenso processo de pensamento: reavaliação contínua da realidade, dúvidas sobre a ação certa, exame constante de consciência e por aí vai. Esse processo leva o sujeito a um conhecimento especial das contradições de sua própria alma e da dos outros. Na vida pública, isso permite negociar sem desprezo pela parte adversa.
2) O deprimido que ultrapassa suas crises sem sucumbir tem, em regra, a coragem e a capacidade de encontrar motivações sem recorrer a grandes princípios (o que pediria um entusiasmo que é impossível na depressão). Lincoln, embora convencido de que a abolição da escravatura fosse moralmente correta, nunca invocou a certeza de que Deus estaria do seu lado, mas alegava (inclusive por escrito) que, quanto a Deus, cada lado podia considerá-lo seu aliado. É uma outra qualidade crucial para a vida pública, a não ser que a gente prefira entregar as rédeas do governo a iluminados e fundamentalistas.
3) A adversidade, para o deprimido, é, por assim dizer, natural (nada existe sem antagonismo). Deparar-se com oposição e derrota é, para ele, uma travessia normal. O resultado é a perseverança.
Recentemente, uma psiquiatra (Kay Redfield Jamison, "Touched with Fire: Manic Depressive Illness and the Artistic Temperament", tocados pelo fogo: a doença maníaco-depressiva e o temperamento artístico) mostrou que uma cura apressada da depressão nos privaria de inúmeros talentos artísticos e literários. Shenk estende o mesmo princípio a uma figura política; ele mostra que, no caso de Lincoln, a depressão não foi "uma falha de caráter que desqualificaria a liderança de um sujeito". Longe de comprometer o pensamento e as decisões do presidente, ela foi o traço de caráter que fez dele o estadista lúcido e necessário num momento sombrio da história de seu país.
Em suma, muitas aventuras dolorosas da mente são partes da subjetividade de quem sofre e, às vezes, partes irrenunciáveis, cuja "cura" deixaria o mundo mais pobre e mais estúpido.
@ - ccalligari@uol.com.br

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Cantiga para não morrer (Ferreira Gullar)


Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.
Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.
Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.
E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento

Tesão de tese - "Pré-versão ou a-versão do avesso"


O tempo diante de mim é limitado

Quando penso ver alguma coisa de novo,

já não estou certo de

poder esperar a confirmação

(Freud)


ÍNDICE

.
Immissio membri homini ...


Parte A - Gêneses/Geração
Normalidade/De perto todo mundo é normal .......................
Normalidades/O avesso do avesso..........................................
Normatividade/De volta ao futuro .........................................
Antiguidades/A Pré-versão de Freud....................................


.

.
Parte B - Batismo/Nomeação
Fundamentos/Padrinhos e demais convidados.....................
Escritura/Tirando de letra.......................................................
Identificação/Anima-l de Z-eus..............................................
Sintoma/Quem pariu Mateus que o embale.........................

.

.
Parte C - Crisma/Confirmação
(Dis)Concordâncias/O outro é um eu em si...........................
Respostas/Luzes na ribalta......................................................
Questões/Vergangenheitsbewältigung...................................
E daí?/Eu sei, mas mesmo assim ...........................................

.

.
... in vaginam feminae.


C.Q.D.


Este é o índice da tese que seria, em 1996, e será, em algum momento deste futuro para o qual, como Freud, já não tenho certeza de ter tempo de esperar. Talvez não mais tese, mas mais ainda tesão a mais. Meu tesão, é claro, é minha análise, com a qual essa "coisa tese" haverá de me comprometer por escrito. Sua Introdução (Immissio membri homini...) está, desde lá detrás de hoje, escrita, num gesto ousado, visto serem as introduções coisas que só se escrevem no final. Eu sei, mas mesmo assim... tá lá, como um corpo belo adormecido estendido no chão duro a ser lavrado e onde se plantará, talvez outra, mas sempre na nomeação da introdução de que se trata.

O que tudo isso tá fazendo aqui no blog? Sei lá, o blog é meu e me deu vontade de comprometer meu desejos de ressureição com meus (2) fiéis leitores. Mais ainda, se um post por aqui clamou um dia por comentários, e eles sempre, mesmo caladamente clamam, nunca outro tanto deles precisou como o meu desventurado tesão. Apoios, parabéns, mnda a brasa, sugestões, perguntas, indicações, tudo será bem vindo e devidamente acolhido. Mostrem para seus colegas psi, suas irmãs ou primas psi, seu psiprório psi, seu psicotrópico.

Help! I need somebody help me!.... I´ve to be so good looking, because I´m so hard to see.

quinta-feira, 24 de maio de 2007

O impossível homem sem qualidades




Como significaria pouco a vida saudável se tivesse por objetivo somente um estado intermediário entre dois extremos


R. Musil

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Pecado original






Sou filho de homem e mulher, segundo o que me disseram. Isto me espanta... acreditava ser muito mais.
,
Lautréamont, Cantos de Maldoror, 1869














Abelardo e Heloísa


Quem um dia irá dizer que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer
Que não existe razão?
.
Eduardo abriu os olhos mas não quis se levantar
Ficou deitado e viu que horas eram
Enquanto Mônica tomava um conhaque
Noutro canto da cidade
Como eles disseram
.
Eduardo e Mônica um dia se encontraram sem querer
E conversaram muito mesmo pra tentar se conhecer
Um carinha do cursinho do Eduardo que disse
- Tem uma festa legal e a gente quer se divertir
Festa estranha, com gente esquisita
- Eu não tou legal, não agüento mais birita
E a Mônica riu e quis saber um pouco mais
Sobre o boyzinho que tentava impressionar
E o Eduardo, meio tonto, só pensava em ir pra casa
- É quase duas, eu vou me ferrar
.
Eduardo e Mônica trocaram telefone
Depois telefonaram e decidiram se encontrar
O Eduardo sugeriu uma lanchonete
Mas a Mônica queria ver o filme do Godard
Se encontraram então no parque da cidade
A Mônica de moto e o Eduardo de camelo
O Eduardo achou estranho e melhor não comentar
Mas a menina tinha tinta no cabelo
.
Eduardo e Mônica eram nada parecidos
Ela era de Leão e ele tinha dezesseis
Ela fazia Medicina e falava alemão
E ele ainda nas aulinhas de inglês
Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus
De Van Gogh e dos Mutantes
Do Caetano e de Rimbaud
E o Eduardo gostava de novela
E jogava futebol-de-botão com seu avô
Ela falava coisas sobre o Planalto Central
Também magia e meditação
E o Eduardo ainda estava
No esquema "escola, cinema, clube, televisão"
.
E, mesmo com tudo diferente
Veio neles, de repente
Uma vontade de se ver
E os dois se encontravam todo dia
E a vontade crescia
Como tinha de ser
.
Eduardo e Mônica fizeram natação, fotografia
Teatro, artesanato e foram viajar
A Mônica explicava pro Eduardo
Coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar
Ele aprendeu a beber, deixou o cabelo crescer
E decidiu trabalhar
E ela se formou no mesmo mês
Que ele passou no vestibular
E os dois comemoraram juntos
E também brigaram juntos, muitas vezes depois
E todo mundo diz que ele completa ela e vice-versa
Que nem feijão com arroz
.
Construíram uma casa uns dois anos atrás
Mais ou menos quando os gêmeos vieram
Batalharam grana e seguraram legal
A barra mais pesada que tiveram
.
Eduardo e Mônica voltaram pra Brasília
E a nossa amizade dá saudade no verão
Só que nessas férias não vão viajar
Porque o filhinho do Eduardo
Tá de recuperação
.
E quem um dia irá dizer que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer
Que não existe razão?

Legião Urbana

Composição: Renato Russo

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Stabat Mater


Pietro da Rimini
c. 1330-40

Se ao menos esta dor servisse,
se ela batesse nas paredes,
abrisse portas, falasse,
se ela cantasse e despenteasse os cabelos.
.
Se ao menos esta dor visse,
se ela saltasse fora da garganta,
como um grito,
caísse da janela, fizesse barulho,
morresse.
.
Se a dor fosse um pedaço de pão duro
que a gente pudesse engolir com força
depois cuspir a saliva fora,
sujar a rua, os carros, o espaço, o outro
esse outro escuro que passa indiferente
e que não sofre e tem o direito de não sofrer.

Se a dor fosse só a carne do dedo
que se esfrega na parede de pedra
para doer visível,
doer penalizante,
doer com lágrimas.

Se ao menos essa dor sangrasse.
.
O Grito - RENATA PALLOTTINI
[A Faca e a Pedra. São Paulo: Brasil Editora, 1965
]
.
O Stabat Mater talvez seja uma das coisas mais musicadas de todos os tempos. O post melhor se diria com Pergolesi, gênio quando se podia ser gênio aos 25 e morrer logo após, tuberculoso. Evitem as gravações com as grandes damas, que reduzem Pergolesi à campo de demonstração vocal e duelo de prima donas. Um dia lhes conto de minha gravação preferida. Por enquanto, bateiem, garimpem, escolham. Mas Pergolesi é essencial.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Para A, de todas as letras


De mal entendida Heloísa,
a casto amor de meu Abelardo,
muitos caminhos, um que de juízo,
e um caudaloso Rio que nela resguardo.
.
E me corre nas veias, em curso perene,
Dos sessenta´s d´hoje aos 80´s idos,
minha A., mulher, com seus dois n´s.
Triste ausente, presente reconhecido.
.
.

sábado, 12 de maio de 2007

Una furtiva lacrima



Una furtiva lacrima
negli occhi suoi spuntò.
Quelle festose giovani
invidiar sembrò.

Che più cercando io vo?
Che più cercando io vo?
M'ama, mi sta amando, vedo.
Io vedo.

Un solo istante i palpiti
del suo bel cor sentir.
I miei sospir confondere
per poco ai suoi sospir.

I palpiti,
i paliti sentir.
Confondere i miei
coi suoi sospir

Cielo, si può morir.
Di più non chiedo, non chiedo.
Oh cielo, si può, si può morir.
Di più non chiedo, non chiedo.

Si può morir,
si puo morir d'amor.


Com Mario Lanza, ou Gigli, de preferência
(para os interessados, é só me pedir, deixar o mail e mando a música; não sei como colocar música por aqui)

Entradas e Bandeiras




I
Bendita a falta do grão de areia
que ao impedir da concha a doente pérola
me permite saber, da enrugada ostra,
o sumo d´elas e o sabor das carnes.
.
E com a droga de vida tomada na veia,
na boca o gosto de minhas carambolas,
em nau fragata, de velas postas,
parto no agora que antes foi tarde.
.
II
Nos frágeis fios de uma teia troncha
escolho os cacos de meu ser amante.
Esqueço a pérola, retenho a concha,
e vou, ao avesso, garimpar meus diamantes.

Pescador não sou, sou bandeirantes.
Volto ao começo, caio na estrada.
No passado deixo o que me é distante,
e vou caçar futuros em novas entradas.
.
III
E seguirei adiante, sem Tordesilhas,
um pouco infante, bárbaro um tanto.
Descobrirei princesas e impassíveis ilhas,
quase esmeraldas, falsos encantos..
.
E nessas entradas de Compostela,
mato nos índios, neles me lanço
na busca fútil de uma tal costela,
falta passada, inarredável ranço.

IV
Fernão Bueno Dias de Anhanguera,
buscarei um só nesses outros tantos.
Nas margens do Rio, descansarei das guerras,
enganarei indígenas, mágico e santo.

Dentro das muralhas onde serei inscrito,
espalharei sementes pela terra irada.
Colherei os frutos de meu suor maldito,
Bornel, bandeiras, outras entradas.

V
E parto, e chego, e torno a partir.
Não resto nunca, alucinado sigo
Construo rastros, planto o por vir
Capitão do mato, raso comigo
.
Mas quando um dia, ao final chegado,
retomarei das pedras o precioso grão.
Doido alquimista, me inventarei achado,
e me plantarei cumprido no descoberto chão..
.
Bar do Frango, 12 de maioo de 2007




sexta-feira, 11 de maio de 2007

A Ópera do fantasma


A imagem é porta que barra e vela
o nada haver por detrás do espelho.
A moldura enquadra a aquarela,
suporta o fantasma que nos faz selo.
,
O Real, miasma, nada se importa.
Insignificância sem remédio ou letra
no espelho, sempre, por detrás da porta,
remenda, costura e nos provoca a treta.
,
A esse mistério o espelho nos remete
à sombra parca do que já não resta.
Mas Narciso insiste e se derrete
O fantasma persiste e faz a festa.

Las Meninas

.
No espelho partido aqui desfeito
Nos mil pedaços que ainda refletem
Escolho os cacos que me competem
E sonho sonhos de outro jeito
.
Buscarei Pipocas, reais imagens,
Anões da corte, por companhia amas
Uma infanta tanta, outras quantas pagens
E vou pintar no mundo, que a vida chama
.
E queima a teima que não me desmama

Tupi ou not Tupi


.
.
.

De verborrágica escrita
aos versos concisos,
sina mal dita
ou final do juízo?
.
Do texto à frase,
da frase às letras.
Brinco com as crases
Versos pernetas

Da Ma, assim cunhada, mas que me foi sempre boa


Eu e a Lua
.
Se eu fosse a lua
quatro faces ao menos teria,
para cada amor um quadrante
nova, cheia, crescente ou minguante
.
Para celebrar o amor, Cheia
calar a voz do sofrer distante
derramaria lágrimas de estrelas
banhando de luz o coração amante
.
Sobre a terra arada e fértil
grão alimento, fruto a nascer
forte energia teria na Nova
para lançar a sorte ao entardecer
.
Ao ver no chão a semente brotando
cachos de uva e cabelo abundante
no milho,na cabeça na roça
sol escaldante
suor nas têmporas, trabalho persistente
muito prazer sou a Crescente.
MA, Campinas

O gabinete do Dr. Lacan



Entrevista à imprensa, Roma, 29 de outubro de 1974
..
Sr. A (jornalista) - ...para alcançar esse algo que nos transcende (inaudível)...aí existem, de fato, as engenhocas e, de fato, as engenhocas comem a gente.
Lacan - Sim, quanto a mim, não sou muito pessimista. Haverá um tamponamento da engenhoca. Sua extrapolação, quero dizer, sua maneira de fazer com que o real e o transcendente convirjam, devo dizer que isso me parece um ato de fé, porque na verdade...
Sr. A - Mas eu lhe pergunto o que não é um ato de fé!?
Lacan - É isso que há de horrível, é que continuamos na feira.
Sr. A - Eu disse fé, não disse feira!
Lacan - ... é assim que eu traduzo fé. A fé é a feira. Há tantas fés, o Sr. compreende, fés que se aninham nos cantos, que, apesar de tudo, isso não se diz bem senão no fórum, isto é, na feira.
Sr. A - Fé, fórum, feira, são jogos de palavras!
Lacan - São jogos de palavras, é verdade. Mas dou enorme importância aos jogos de palavras, o sr. sabe. Isso me parece a chave da Psicanálise.
.
Panos rápidos!
(mas a entrevista continuou; esses jornalistas...!)

terça-feira, 8 de maio de 2007

Reflexão freudiana


Rafael, Azeitona, Helinho
barangas simpáticas,
ou por demais apáticas,
na mesa escrevinho,
e observo a pátria,
onde errei sozinho.

Aos caros amigos


Pensá-los lacanianos
comigo multiplicando
sentidos, pensos e tentos,
meus a-migos,
outros de mim comidos,
diz tanto que
o onde andará, onde andará
meu pensamento,
fica ousadia fácil,
navegação sem tormento,
suaves campinas,
sonhos de um outro maestro,
bem dita ave de rapina
de meus passados restos.

Ai, ais

1

Foi tudo que eu sempre quis
Fazer valer a-penas
O que de mim se diz

2

Prestar a tensão em mim
é dito que quisera feito
até o fim.

3

Certos lugares têm
a capacidade de nos fazer felizes
com qualquer bem.

4

Ela não é nada
Pouca presença, resto de tudo
Sem lugar na cama, criado mudo

5

Deus te guarde e console
Que a vida, meu rapaz,
Não é mole.

Eu sei, mas mesmo assim...

O que me move se deve a mim, mas mesmo assim se deve.

segunda-feira, 7 de maio de 2007

Os Espelhos de Borges,


Los espejos
de Jorge Luís Borges
Yo que sentí el horror de los espejos
no sólo ante el cristal impenetrable
donde acaba y empieza, inhabitable,
un imposible espacio de reflejos
.
sino ante el agua especular que imita
el otro azul en su profundo cielo
que a veces raya el ilusorio vuelo
del ave inversa o que un temblor agita
.
Y ante la superficie silenciosa
del ébano sutil cuya tersura
repite como un sueño la blancura
de un vago mármol o una vaga rosa,
.
Hoy, al cabo de tantos y perplejos
años de errar bajo la varia luna,
me pregunto qué azar de la fortuna
hizo que yo temiera los espejos.
.
Espejos de metal, enmascarado
espejo de caoba que en la bruma
de su rojo crepúsculo disfuma
ese rostro que mira y es mirado,
.
Infinitos los veo, elementales
ejecutores de un antiguo pacto,
multiplicar el mundo como el acto
generativo, insomnes y fatales.
.
Prolonga este vano mundo incierto
en su vertiginosa telaraña;
a veces en la tarde los empaña
el Hálito de un hombre que no ha muerto.
.
Nos acecha el cristal.Si entre las cuatro
paredes de la alcoba hay un espejo,
ya no estoy solo. Hay otro. Hay el reflejo
que arma en el alba un sigiloso teatro.
.
Todo acontece y nada se recuerda
en esos gabinetes cristalinos
donde, como fantásticos rabinos,
leemos los libros de derecha a izquierda.
.
Claudio, rey de una tarde, rey soñado,
no sintió que era un sueño hasta aquel día
en que un actor mimó su felonía
con arte silencioso, en un tablado.
.
Que haya sueños es raro, que haya espejos,
que el usual y gastado repertorio
de cada día incluya el ilusorio
orbe profundo que urden los reflejos.
.
Dios (he dado en pensar) pone un empeño
en toda esa inasible arquitectura
que edifica la luz con la tersura
del cristal y la sombra con el sueño.
.
Dios ha creado las noches que se arman
de sueños y las formas del espejo
para que el hombre sienta que es reflejo
y vanidad. Por eso no alarman.

domingo, 6 de maio de 2007

Repetição insistente


Paraíso Perdido
(para a moça em frente, ao largo e a caminho do mar que aqui não há)

Me diz quanto!
Quanto você quer,
quanto exigirá,
para me dar
esse umbigo que bóia
nesse liso mar
de pele.
.
Quanto
para minha língua explorar,
esse buraco com fundo,
essa marca recolhida,
negativo botão de rosa,
lugar do corte
que te fez formosa.
.
Quantas maçãs,
quantos mil-réis,
que carnes minhas,
deposito a teus pés?
Te pago as contas,
te apago as penas,
de meu Sansão,
te dou melenas,
de meu João,
minha cabeça?
.
Não cobro a costela,
não me faço dono,
meus direitos não retomo,
esqueço as outras elas.
.
Me diz!
Pago!
.
E te lamberia,
com língua ofídica,
tomando em mim,
de Eva,
o melhor presente.
E deixando de lado
Adão e o pecado,
encantar-me-ia
serpente.

sábado, 5 de maio de 2007

Delireu

De antemão explico, para que não reste nenhuma dúvida, que não sou ele, mas ele é eu. Deu para entender? Se deu, deu; se não deu, fica assim mesmo, que mais que isso não sabe ele, nem eu. Coisa assim mesmo, meio impossível, como acostumei a conviver nestes tempos dele e eu, no indecidível de nós dois nem um.
Esse blog, por exemplo, é coisa dele, mas tudo aqui é meu. E o que não é meu, pior ainda, é puro eu, coisas dele quando lhe faço meu. Já dele não sou, pois ele é eu e não me sou meu. Complicou mais ainda? Ele sente muito, mas assim sou eu, cheio dessas reviravoltas, cambalhotas e carambolas. Passo com a banda, não vejo passar. Sou a mais dele e nele me falto até me esbaldar.
A escrita, por outro mesmo lado: os traços são dele, mas nela lhe traço, pois o traço é eu. E lhe traço o eu lá dele, mas sendo eu, desde os começos quando ele apareceu, num estalo precipitado quando pensou ser eu. Desde então ele me supõe, um eu lá dele, que não sou eu, que me imponho a ele e o faço meu. Coisa que muitos outros eus acabam não conseguindo, e somem nas sombras dos eles deles, que viram do Outro, que não é Eu.
Cansativo, não é mesmo? Daí que a maioria fica na mansidão do terror do Outro, que só assusta lá as negas dele, grama-ticando o eu no bom comportamento da pouca linguagem, no eu retórico que não sou eu nem ele, lisonja de um bem dizer que não nos diz nem nada. Graças a eu, não é o caso dele. Até que ele tenta assossegar-se nos Outros que os outros lhe emprestam, mas sou mais eu, e remonto o furo desses Outros dos outros do eu, deles, distante. Pois furo é furo, tudo igual. Desmonto, demonstro, e lhe imponho meu, again and again, olho no olho, eye no I, as you can say. Coisa de doido, é o que pensam muitos, os do Outro, que não sou eu.
Mas vamos levando, sempre a bailar, pois se parar o Outro pega, se correr lhe come o Outro, coisa dos outros doidos, pois todos são. Ele e os outros, cada qual com a sua doideira. Sem contar os doidos doidos, os eus sem eles, ou eles sem nem sombra de eu.
E vamos, deslizando sempre, mas muito bem acompanhados. Cheio d´eus famosos, é só saber olhar. Oscar Wilde, Foucault, Genet, Mishima, nenhum doidão, apesar de doidões também ter vários, inclusive esses próprios, de vez em quando. Pega o Van Gogh, o Bispo do Rosário, e tantos outros mais, que muito sofreram nessa de eu meio sem ele pra botar no mundo do Outro, rei da linguagem, mãe de todos e dono da bola do jogo que temos de jogar se não queremos perder orelhas ou acabar na Juliano Moreira. Sem contar os tantos outros pares impossíveis de ele e eu, como ele e eu, que deslizam anônimos provocando eles lá na linguagem do Outro deles. Porque, que fique aqui bem dito, eles, os outros, são todos iguais. Já eu e ele somos só eu e ele, mesmo quando me finjo nele no mundo deles. Daí não termos par, nem paz, apesar de vivermos tentando cumplicidades que nunca duram, dada nossa diferença. Mas, me entenda, nós não somos diferentes deles, já que diferentes todos se supõem, e são num assim dizer. Nós somos, ele e eu, pura diferença, o que é completamente diferente. Pois eu sou eu, ele é ele, ele é d´eu, e eu sou traço, troço, que lhe marca meu.
O que eu quero com tudo isso? Não sou de mais querer, que isso é coisa dele, já que meu querer é ele, e ele é d´eu. Onde isso nos leva? Não sou de chegar, sou puro de vagar de porto a porta, e vice versa que nunca é só ao contrário, de lá para acolá, que cá sempre já era, como o rio que passa e insisto, eu mesmo, em ver igual. Pura metonímia, sacou? Tava procurando metáfora? Ele sente muito, e eu lhe aconselho: tente no shopping, tá cheio delas, algumas até bem engraçadinhas. Aliás, nada contra as metáforas, das quais abuso na boca dele, que o jogo é esse e o sucesso é uma delícia. Prá bem dizer, adoro uma metáfora, mas só para escorregar depressinha prá outra. Metaforonímico, como dizem eles por detrás dos eus lá deles.
Eu vou ficando, que na escrita é onde mais me arrisco, pois só na busca inútil existo e aqui me fixo, meu horror confesso. Mas ele estará por aí, onde eu o arrastar. Pois agora vocês sabem: lá onde ele está, quem manda é eu, pois eu não sou ele, mas ele é eu. Nunca se engane, por trás daquele olhar lá dele, me encontro eu. E muito cuidado, pois eu sou foda, mas quem fode é ele (e se fode muito, pois ele é meu e eu, já disse, sou pura foda de se meteu). Pois vai daí que você gama n´eu, e tem que viver com ele? Se quer um lago, eu passo ao largo, se quer um rio, sorrio. Mas quem manda é eu. Entendeu? O resto é conversa de Prometeu mas não cumpriu.
Puta que pariu, ele sumiu! E eu? Fodeu!

quinta-feira, 3 de maio de 2007

Clarice

Sempre quero mais do que vem nos milagres
Clarice Lispector




Valha-me Frei Galvão,
 sangue de meu sangue
 desde que eu era um sonho nem sonhado 
lá em Guaratinguetá. 
E viva a vó Maria José, bem dita Pata, 
que me permitiu, 
na comunicação sanguínea com o santo homem, 
esperar os milagres
 e continuar querendo mais. 
Avoé, Santa Clarice, 
barata que dou por barato, 
e não a como, nem há como, 
para esperar do milagre o que nele falta 
e desejo.

terça-feira, 1 de maio de 2007

Intermediando as crises, a escrita e uma grande amiga.


O escrever como necessário e inevitável. Eu aprendia


Maio de 2007