segunda-feira, 3 de março de 2008

Música calada, bendita solidão sem palavras.

Fevereiro foi um mês muito triste, tristemente solitário. Um mês, como digo na postagem que, ao seu final, coloquei com data de 01 de fevereiro, que melhor não houvesse sido, mas que, ainda e mesmo assim, foi. Passou, como passam os meses, inevitavelmente, deixando um certo rastro de tristeza, que eu associava à solidão, coisa mal dita naquele mês acabado de morrer.

No dia 01 de março, um DVD supostamente virgem me reservava uma surpresa. Ao tentar usá-lo, descubro que ele não era mais virgem e continha uma cópia do documentário Nelson Freire, de João Moreira Salles. O documentário, que anos atrás assisti com Gilza no Espaço Unibanco lá no Rio, foi assistido novamente na solidão de minha sala, no fim da tarde daquele mesmo dia. E aí a solidão mudou. Não que se acabasse, mas se tornou bem dita.

A música, coisa sem palavras, me lembrou que em certas horas, para se contemplar a beleza, a solidão é necessária e irremediável, e que só ela nos permite a entrega que a beleza musical necessita para ser incorporada em nosso compreender. Quando o filme acabou, fevereiro era só lembrança e uma nova qualidade de solidão ainda me acompanhou por horas a fio.

Eu queria muito dividir essa experiência com vocês, coisa que me parecia impossível, já que não dá para postar um filme inteiro no blog. Mas a beleza da coisa me fazia querer mais do que recomendá-lo para aqueles que ainda não o assistiram (mas façam-no, que é um dos mais belos e delicados documentários que já assisti em toda a minha vida). Havia no filme um trecho, esse que aqui posto, que me tocava profundamente e que, achava eu, resumia em cerca de 7 minutos tudo que fazia o filme uma coisa profundamente bela e delicada. O problema era como retirar só aquela parte de um DVD completo.

Como já comentei aqui, não sou muito versado nessas coisas de vídeo, nada além das brincadeiras musicais que tenho postado. Assim mesmo, lá fui eu para o Nero e, depois de muito bater cabeça nesses dois dias, consegui o clipe que me propunha a mostrar. Não sei se a qualidade estará boa (o som saiu muito baixo, portanto aumentem o volume por aí), mas se tocar na tela de vocês como tocou na minha, tenho certeza que tocará vocês.

O trecho, ou melhor, os dois trechos, mostram uma homenagem de um músico a outro músico, a beleza de uma partitura, que se repete nos dois trechos, e os rostos profundamente enlevados, e portanto solitários, dos ouvintes. Primeiro a emoção de Nelson Freire escutando a interpretação de Guiomar Novaes, depois as faces de uma platéia (que me parece russa), escutando o pianista executar aquela mesma música que havia lhe enchido os olhos d´água. Tudo isso magistralmente dirigido por João Moreira Salles. Enfim, um resumo de tudo que há de belo naquele documentário, mas um momento especial, onde essa coisa da solidão bendita, e necessária, melhor se diz, e onde a beleza é pura delicadeza musical.

A música, que a legenda não deve permitir ler, é uma adaptação para o piano, por Sgambati, de um trecho da Ópera Orfeu & Eurídice.


2 comentários:

Anônimo disse...

Oi Zédu,

Maravilhoso vídeo com que nos brinda neste novo março de promessas de vida nos corações de quem assim o queira.

Pude ouvir somente com o fone de ouvido, pois de fato o volume da gravação ficou muito baixo.

Sendo assim não pude encher a minha casa com a sonoridade do Piano de Guiomar Novais de quem estou instigada a ouvir um velho vinil, e também com o piano de Nelson Freire. Tudo se misturaria ao aroma do biscoito de polvilho assando, das torradas e do café vindos lá de dentro.
Assisti ao vídeo conforme dito por você, na bendita solidão de quem olhava para o verde da serra lá no alto e de frente para onde estou.

Nada ocorre por acaso...
Chegaram aqui biscoitos, torradas e café .

Será perfeito ver e ouvir novamente
o vídeo..vamos lá...

Com beijo muito agradecido,

Meire

I'm nobody/Who are you? disse...

Zédu, caro, outra solidão bendita magistralmente enfocada por João Moreira Salles: "Santiago". Tente assistir, foi a melhor coisa que vi em 2007, não consegui rever, não acho em locadora, nem para vender. Aí está um presente que gostaria de te dar.