terça-feira, 30 de setembro de 2008
O protesto dos sabiás
O ano? 1968. O ano em que a coisa ficou complicada aqui embaixo do Equador mais tropical que há. No final dele viria o AI-5, o sumo da burrice militar, os anos de chumbo, a covardia do Sistema, as mortes, os desaparecidos, os exilados, a nossa impotente derrota por muitos anos, até que a burrice se consumisse a si própria e caísse de podre. Em 1968 a ditadura, estúpida como soem ser as ditaduras, piorada pela burrice endêmica da classe militar brasileira, se instala sem vergonha sobre o país. Mesmo antes do terror anunciado, no entanto, já vivíamos exilados de nós mesmos em uma terra que não podíamos tratar como nossa.
Nesse ano, o Festival Internacional da Canção, patriocinado pela mesma Globo que vem navegando por ditaduras e democracias, escolhe duas músicas como finalistas de sua fase nacional. A escolhida iria "representar o Brasil" na fase internacional do festival (a Globo sempre teve essas manias de grandeza, esse desejo de ser internacional, coisa que um Bispo esperto anda incomodando): Prá Não Dizer Que Não Falei das Flores, de e com Geraldo Vandré, e Sabiá, de Tom & Chico.
A história vocês conhecem (ou não, já que ela tem 40 anos de idade e não tenho a mínima idéia da tua, ó leitor, e menos ainda de onde no mundo você me lê -também tenho minhas manias de grandeza, ainda que incentivado pelo meu contador). O Maracananzinho em peso canta com Vandré, que se apresenta sozinho com seu violão. Coisa de arrepiar qualquer um, mesmo sabendo que até Roberto Carlos, cantando suas bobagens atuais, acompanhado por um Maracanã de gente, é capaz de arrepiar qualquer um. Sabiá vence e recebe uma das maiores vaias já escutadas em festivais. É imediatamente classificada, em nossa tola festividade inconsequente, como música tolinha, cantiga de amor não condizente com a revolta instalada em nosso peito juvenil.
40 anos depois, pensem bem: qual das duas representava mais o sentimento de dor, tristeza, exílio em sua própria terra? A conclamação às armas explícita de Vandré ou a melodia do Tom, linda como só o maestro soube fazer na MPB, e a letra do Chico a nos lembrar do sabiá de Gonçalves Dias, das palmeiras que nunca crescem nos desertos do exílio, do sonho da volta e do dia que iria raiar? Quem protestava? Quem bradava burramente frente o Poder Armado e violento que nos calava, como depois calou Vandré, de alma perdida desde então? Com quem, até hoje, cantamos com uma emoção que só uma música linda, com uma letra primorosa, é capaz de fazer cantar emocionados? Quem ficará, sejam quantas forem as burrices, as ditaduras, as tolices liberais, que ainda hoje nos impedem esse Brasil onde, um dia, ainda cantará, soberano, uma sabiá no alto de uma palmeira que ainda não há?
Eu era jovem e também quase me enganei na classificação estúpida de "musica bobinha" que Sabiá recebeu. Não me lembro se vaiei, mas talvez tivesse vaiado. E Sabiá aqui comparece como meu pedido de desculpas envergonhado pela nossa estupidez da época. As massas unidas são sempre burras e presas fáceis das bestas armadas. A poesia, em música e letra, essa atravessa paredes, décadas, censuras e permanece, cada vez mais viva.
Agora vou até a Praça, olhar a palmeira que há por lá e, quem sabe, com sorte, escutar cantar uma sabiá.
Desculpa Chico, Saravá Mestre Antonio Brasileiro de Almeida Jobin!
segunda-feira, 29 de setembro de 2008
Só neste despedido
Desta minha vida herivelta
De nossos pobres recados
De, em mim, o tolo poeta.
À Dalva, minha estrela-guia
Entrego minha toda renúncia
O sumo de minhas agonias
O vazio de minhas denúcias.
E espero, de coração perdido
O encontro de nosso encontro
E a escuta de um meu pedido.
Onde contaremos o conto
De um nosso amor despedido
E, da história, o devido ponto.
A solidão do poeta
Se eu me morrer de amores?
Quem, dentre amigos, tão amigo
Para estar no caixão comigo?
Quem, em meio ao funeral
Dirá de mim: - Nunca fez mal ...
Quem, bêbedo, chorará em voz alta
De não ter me trazido nada?
Quem virá despetalar pétalas
No meu túmulo de poeta?
Quem jogará timidamente
Na terra um grão de semente?
Quem elevará o olhar covarde
Até as estrelas da tarde?
Quem me dirá palavras mágicas
Capazes de empalidecer o mármore?
Quem, oculta em véus escuros
Se crucificará nos muros?
Quem, macerada de desgosto
Sorrirá: - Rei morto, rei posto...
Quantas, debruçadas sobre o báratro
Sentirão as dores do parto?
Qual a que, branca de receio
Tocará o botão do seio?
Quem, louca, se jogará de bruços
A soluçar tantos soluços.
Quem há de despertar receios?
Quantos, os maxilares contraídos
O sangue a pulsar nas cicatrizes
Dirão: - Foi um doido amigo...
Quem, criança, olhando a terra
Ao ver movimentar-se um verme
Observará um ar de critério?
Quem, em circunstância oficial
Há de propor meu pedestal?
Quais os que, vindos da montanha
Terão circunspecção tamanha
Que eu hei de rir branco de cal?
Qual a que, rosto sulcado de vento
Lançará um punhado de sal
Na minha cova de cimento?
Quem cantará canções de amigo
No dia de meu funeral?
Qual a que não estrá presente
Por motivo circunstancial?
Quem cravará no seio duro
Uma lâmina enferrujada?
Quem, em seu verbo inconsútil
Há de orar: - Deus o tenha em sua guarda.
Qual o amigo que a sós consigo
Pensará: - Não há de ser nada...
Quem será a estranha fugura
A um tronco de árvore encostada
Com um olhar frio e um ar de dúvida?
Quem se abraçará comigo
Que terá de ser arrancada
Quem vai pagar o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
Rio, 1950 Vinícius de Moraes
Dois Rios
Cantar, dizem, é um afastamento da morte. A voz suspende o passo da morte e, em volta, tudo se torna pegada da vida. Dizem mas, para mim, a voz serve-me para outras finalidades: cantando eu convoco um certo homem. Era um apanhador de pérolas, um vasculhador de maresias. Esse homem acendeu a minha vida e ainda hoje eu sigo por iluminação desse sentimento. O amor, agora sei, é a terra e o mar se inundando mutuamente.
Por Inês
sexta-feira, 26 de setembro de 2008
Sampa
O nascimento do cravo
quinta-feira, 25 de setembro de 2008
Menina com brinco de pérola
Que resiste ao nada que a sustenta
O que me seduz é a beleza,
Que resiste às carnes corroídas
O me diz é o carinho
Que resiste à ausência que se impõe ao toque.
.
O que sei é o que me sinto,
Belo, encantado, acolhido
Como a pérola da qual nada sabe a concha
Me resguardo em quem não me sabe.
Escondido, escandido, nada para nenhum olhar
.
Até que um pescador me colha e me revele,
Outra pérola em busca de uma menina
Que me fixe enfeite, enfeitiçada,
E me retorne ao nada donde parti.
.
.
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
Pérolas do brinco de uma menina
segunda-feira, 22 de setembro de 2008
Ausências e despedidas
O comentário que virou post
Era o teu rosto.
Era a tua pele.
Antes de te conhecer,
existias nas árvores
e nos montes e nas nuvens
que olhava ao fim da tarde.
Muito longe de mim,
dentro de mim,
eras tu a claridade.
José Luís Peixoto
sábado, 20 de setembro de 2008
Alegria passarinha de Moraes. Passará?
Jacobinos e girondinos
Sobre os jacobinos e girondinos? Isso não conto, mas dois lados de uma revolução, um deles fica, hoje, on the sunny side of the street.
quinta-feira, 18 de setembro de 2008
Impressão Digital
Os meus olhos são uns olhos.
E é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos
onde outros, com outros olhos,
não vêem escolhos nenhuns.
Quem diz escolhos diz flores.
De tudo o mesmo se diz.
Onde uns vêem lutos e dores
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.
Nas ruas ou nas estradas
onde passa tanta gente,
uns vêem pedras pisadas,
mas outros, gnomos e fadas
num halo resplandecente.
Inútil seguir vizinhos,
querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos.
Onde Sancho vê moinhos
D. Quixote vê gigantes.
Vê moinhos? São moinhos.
Vê gigantes? São gigantes.
António Gedeão
(Portugal/1906-1997)
terça-feira, 16 de setembro de 2008
Botequinesca
Musiquinha infantil
Pisadas Astrológicas
Às vezes, pisamos nos astros distraídos. Mesmo depois de sabermos deles pelos astrólogos de plantão. Pois pisar vem no nosso destino, nos astros revelados, e é sina do mesmo sintoma que goza quando os astros, na palavra de um outro, nos bem dizem.
Por outro lado, Chão de Estrelas é marco da MPB. Maysa é musa. A coisa toda é linda. Juro que, tivesse eu mais tempo (quem sabe?) faria com a música algo mais elaborado. Enquanto não faço, e enquanto fico sem saber de meus astros, distráidos ou não, curtam a música.
segunda-feira, 15 de setembro de 2008
Descobrindo os véus das musas
usa e abusa,
do poeta que nela se inspira.
O poeta acordado,
trabalha, transpira
e poema dobrado.
Godot não chega nunca, por definição
Amanhecer no Araguaia
Cantiga de Acordar (Edu e Chico)
Foi uma ilusão
Uma insensatez
Há que pôr o chão
Nos pés
Era como um trem
Que anda sem passar
Era um tempo sem
Lugar
Mas
Foi um sonho bom
De sonhar porque
Me sonhava com
Você
E então seu canto veio me acordar
Era uma ilusão
No interior
De uma outra ilusão
Maior
Mas
Você foi pro sol
Noite me envolveu
Num silêncio igual
Ao seu
E então seu canto veio me acordar
Tudo é uma ilusão
Os que estão aqui
Esses não estão
Em si
Do universo, o além
Faunos ou mortais
Vão restar mais nem
Sinais
Tudo o que se vê
É o sonho de algum
Pobre sonhador
Todas as estrelas
Todas as misérias
Todos os desejos
E a canção do meu amor
Tudo o que se viu tudo o que se foi
Última ilusão
Amanhece já
Vai-se abrir o chão
Quiçá
A ilusão se esvai
É uma cena só
E a cortina cai
Sem dó
Vai cessar o som
A sessão já foi
Despertar é bom
Mas dói
Pedras vão rolar
Choram serviçais
Vão se espatifar
Vitrais
Tomba o refletor
Ardem camarins
Cai no bastidor
A atriz
Descarrila o trem
O pilar cedeu
Vai morrer meu bem
E eu
Num jardim fugaz
De espirais sem fim
Eu corria atrás
De mim
O homem se distrai
Dorme em boa fé
Sua sombra sai
A pé
Mas
Foi uma ilusão
Uma insensatez
Há que pôr o chão
Nos pés
Edu Lobo & Chico Buarque
domingo, 14 de setembro de 2008
Estudo para um vídeo cheio de vazios e sombras
I´m all of me, can´t you see?
Tessituras
I.
Repetição:
Teu fantasma, meu fantasma,
Assombração.
II.
Quando a alma caatinga
o poeta se recolhe
e a poesia míngua
III.
Chocante!
Absurdo!
Um moço tão falante,
mas tão surdo.
terça-feira, 9 de setembro de 2008
Cem anos de perdão (pelo vídeo roubado) ou Presente final
Um dia ela, bem como ela é, meteu as caras no Windows Movie Maker e fez um filminho que me deu de presente. Respondi com outro e não falamos mais nisso.
Bem pouco tempo depois ela faz essa belezura que vocês também poderão ver lá onde lá onde ele se explica melhor. Morri de inveja. Roubei.
E se vocês querem entender melhor o video, a arte da escolha que nos confunde a princípio, cliquem aqui. Aí, além de dar todo o sentido ao vídeo, com as palavras que aqui florescem como as outras flores,vocês vão cair em um espaço cheio de nacos de beleza por escrito.
Palavra deste ladrão que, roubado, aqui implora seus devidos cem anos de perdão.
Adorando os 60
Grande amiga, sempre presente
Deter o andar do tempo
Antonio Miranda Fernandes
Como faz, suponho, quase toda gente,
Eu, às vezes, para avaliar os meus passos,
Interrompo o caminhar e olho para trás.
Neste mundo em que quase tudo se
Compra e se vende,
Vejo um tabuleiro aberto, talvez pequeno,
Com coisas que dividi e ainda o faço,
(mesmo porque a bagagem ficaria pesada)
Sem nada pedir em troca.
Meu coração não tem sombras como abrigo,
E raramente vivi medo que eu não esperasse,
Ou fiz meia-volta diante de um perigo,
Se o meu objetivo estava adiante.
Mas hoje me pergunto que corda usar,
Que laços fazer para deter, num avançar lento,
Sem que ele deixe de ser meu,
Este andar do tempo que me incomoda.
Presente de |Meire
segunda-feira, 8 de setembro de 2008
Menino encantado
O ano que hoje incio foi um ano de grandes conquistas. Saindo de uma solidão necessária em setembro de 2007 (que revejo nos poemas que postei como "Contagem regressiva"), o ano foi de consolidação de perdas passadas, de moças do sonho, de gente nova, novas perdas que doeram mas me mostravam vivo, doenças de amor, encontros e reencontros, idas e vindas, e, mais que nada, uma aprendizagem muito grande através dos mais variados tipos de amigos que fui recolhendo durante esse ano todo até a data de hoje.
De certa forma, o ano foi de confirmação do menino que suporta o idoso que hoje tornou-se oficial. Esse menino que vai ajudando tudo que em mim era velho a aprender o valor da ternura, da confiança em um outro, do encantamento com o simples, da desnecessidade dos rótulos, dos perigos dos nomes que nos engessam. Mais menino, vou brincando de viver com 60 anos. E me divertindo.
Por isso a volta da música que aqui já compareceu, as palavras de Vasco Gato, e a dedicação a todos que hoje caminham mais encantados ao meu lado. E meu agradecimento mais sincero àquela que tanto me ajudou nessa passagem dos últimos meses. Minha mais querida, e muito mais que querida, amiga. Com ela ganhei, de mim mesmo, uma aposta. E começo, hoje, outra.
Presente de aniversário
Passem-se dias, horas, meses, anos
Amadureçam as ilusões da vida
Prossiga ela sempre dividida
Entre compensações e desenganos.
Faça-se a carne mais envilecida
Diminuam os bens, cresçam os danos
Vença o ideal de andar caminhos planos
Melhor que levar tudo de vencida.
Queira-se antes ventura que aventura
À medida que a têmpora embranquece
E fica tenra a fibra que era dura..
E eu te direi: amigo meu, esquece...
Que grande é este amor meu de criatura
Que vê envelhecer e não envelhece.
Vinicius de Moraes - Rio, 1942.
sábado, 6 de setembro de 2008
Contagem regressiva: -2 (Meu presente aniversário)
ninguém convidará meus amigos,
encherá balões coloridos,
escolherá o bolo do aniversariante.
Nem enfeitará as mesas
de um improvável Azeitona,
que se tranformava no seu ser radiante.
Ninguém fará a feijoada impossível,
de fogão inaugurado só para meu ser feliz.
Ninguém enfeitará o gramado,
com mesas de bem querer.
Ninguém convidará Francisquinho,
Eliza, Fernando,
e meu doce Miguel Arcanjo.
Ninguém me dará a risada da Anna,
a alegria do Jorge,
Marco Aurélio, pai de mesa e cama,
e a brisa de minha sacra família
e a vista a perder de vista.
Sem Christininha de Moraes,
sempre muito mais Gurjão,
Azeitona, Severo, Toninho,
Olavo que não há mais,
todos meninos do velho bar que morava em meu coração.
Ninguém me dará uma festa,
surpresa que eu sempre dizia besta.
Com ninguém teimarei nada querer,
não farei de conta um desejo de ficar só,
manha bobinha da criança que sempre quis dó.
Estarei só.
De todos vocês.
Estarei só
de quem, sempre, tudo isso fez.
Só!
Sem Gilza.
De vez.
Meu aniversário morreu.
Sobrei eu.
E os anos que insistem em passar,
até eu mandar parar.
sexta-feira, 5 de setembro de 2008
Aniversário (2007)
Aniversário
[Álvaro de Campos]
No TEMPO em que festejavam
o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No TEMPO em que festejavam
o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas
lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
Escritura
De repente, te vi
Contagem regressiva: -3
a musa do canhestro Frango,
jamais uma decadência.
Antes, a prova, a sangue frio,
que seja qual for o marmanjo,
teu charme é uma indecência.
Uma fêmea em tom maior,
uma beleza daquelas raras;
além de meus olhos de amor
e todas as minhas taras.
Pois seja, minha menina,
em todo teu resplendor,
mulher em minha retina,
sonho onde morro de amor.
Feeling the blues
quinta-feira, 4 de setembro de 2008
Quem nunca foi brega que atire a primeira pedra
E la nave vá
Contagem regressiva: -4 (Odisséia do mero eu)
Acabei virando porto,
É melhor esclarecer, numa boa,
Pra que nada nos reste torto.
Que você esteja atento
Nessa minha parca odisséia,
Aos versos soltos ao vento
e minha toda prosopopéia.
Não falo aqui de sereias,
Que coragem não tive tanto,
De me amarrar com correias
Para delas escutar o encanto.
Nem conto de outros monstros,
Nem de lutas c´outras gentes.
Pois se Homero me assopra o ponto,
Meu grego é bem diferente.
Não lerá sobre ilhas mágicas,
Nem de como carambolei ciclopes.
Mas, de tudo a coisa mais trágica,
É Penelope, que perdi em duro golpe.
Odisséia, apesar e mesmo assim,
Aqui canto um quase nada
Da história de como sarei de mim
E toquei minha jornada.
Pois se grega foi a tragédia
Onde tudo começou,
Aqui, sem ser jamais comédia,
Do drama pouco restou.
Mas você tem que querer
Ler o blog de cabo a rabo,
Sendo o cabo o seu nascer
E o rabo o que aqui não acabo.
Pois quando, vindo lá do começo,
Aqui você retornar,
A menos de algum tropeço,
Mais viagem há de encontrar.
Por isso, lhe peço, atente,
Para o ritmo da falação.
E sabendo que sou só gente,
Há de costurar a questão.
Fique então, pois, avisado,
Se aqui acabou de chegar,
Que meus versos ficam pelados
Se ao começo não se emendar.
Mas confesso, sem vergonha,
Que preferia esses versos cantar
Para uma cabeça na fronha,
Para a mulher de meu deitar.
Assim, se souber de alguma
Que se encante com tanto querer,
Me aponte, me mostre a uma
Que vai comigo a-mor-te-cer.
E, depois de tão confessado,
Lhe deixo com sua vontade,
E lembro que preguiça é pecado
Que faz da vida metade.
Mas se você não está contente
Com esse meu cordel encarnado,
Não se avexe, siga em frente,
Meu prazer já está postado.
Contagem Regressiva: -5 (Só as palavras me acreditam)
quarta-feira, 3 de setembro de 2008
Martha, my dear
Aprendizado
Respiro o teu corpo
Respiro o teu corpo:
sabe a lua-de-água
ao amanhecer,
sabe a cal molhada,
sabe a luz mordida,
sabe a brisa nua,
ao sangue dos rios,
sabe a rosa louca,
ao cair da noite
sabe a pedra amarga,
sabe à minha boca.
Eugénio de Andrade