quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

O blog tirou férias


Feliz Natal a todos!

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Pirata de Pindamonhangaba


Nem sei se vocês repararam, mas comecei a postar os vídeos a partir do YouTube. Ou seja, invento os filminhos como sempre fiz, alguns bonitinhos, outros devendo em imaginação, paciência e técnica, e faço o upload dos mesmos no YouTube antes de colá-los à postagem que me interessa. E faço isso por duas razões principais: a) é mais rápido o processo de upload no YouTube do que por aqui no blogger; e, b) o YouTube virou outro lugar onde zedupoca exerce o exibido que lhe é natural (e onde, alvíssaras, até homens me comentam).
Mas, como venho descobrindo, lá os "donos das músicas" são muito mais atentos, e chatos. E a pirataria, às vezes, é punida e proibida. Como aconteceu com um vídeo que postei aqui nos tempos em que o aqui vinha primeiro. A música era What´s New com Billie Holliday (antes só os donos da Elis ou do Tom, nunca vou saber, haviam me proibido de colocar o Soneto da Separação como eu havia feito em casa). Pois é, meses depois a coisa foi vetada por lá, os donos dos direitos me proibiram de veicular o filminho com a música deles. Me pegaram de surpresa, pirata denunciado, bucaneiro de calças na mão. E lá se foi, banido para o fundo da popa do galeão, ou pior, condenado a andar em alguma prancha internética, minha pobre pirataria, minha usurpação dos direitos de outrem.
É bem verdade que em várias outras ocasiões os donos das músicas já haviam comparecido, deixando claro que a "nêga" lhes pertencia mas, ainda assim, generosos, me permitiam continuar a usá-las em minhas inconfessáveis razões youtúbicas. Coisas que meu amigo Jorge entende e defende, essas coisas do direito aos passarinhos que nos caem nas mãos ou nos ouvidos Eu, pirata, me confesso e sigo em frente, busco outras caravelas para abordar, outras pepitas para roubar, outros tesouros para usurpar, covardemente internético, ousadamente corsário, insistentemente bucaneiro.
Se ainda me barrassem pela má qualidade dos vídeos que associo às músicas, ainda entenderia. Afinal, a coisa é sempre estética mais do que ética. E eu devia aprender melhor as imagens antes de juntá-las com as músicas lindas. Mas não, a coisa é só um exercício prepotente de um direito "intelectual" à obra, um deixar claro que nas nêgas deles não posso por a mão e, absurdo, demonstrá-las, com as roupinhas com que as enfeito, para minhas poucas dezenas de youtubeouvintes.
Assim, barrado do baile da Billie, meio assim p. da vida, criei outro filminho quase igual, mesma imagem, mesma música, só que agora tocada no sax gentil de John Coltrane. Fiz, uploudei e, os donos do Coltrane reivindicaram posse mas me concederam a graça de exibir minha pequena obra-prima nos ares dos tubos de vocês.
E Pindamonhangaba, o que tem a ver com tudo isso? Bom, ter até que tem, mas conto outra hora. E até já sei com que música retomarei minhas lembranças de Pinda, meu estágio final antes de virar o engenheiro que nunca me tornei. Aguardem, Pinda will return!!
Por enquanto, fiquem com meu único vídeo feito só de raiva. Ficou a cara de seu motivo. Mas a música é linda, Coltrane um gênio e, principalmente, o blog precisa andar um pouco por dia.


segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Poema recolhido

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Eu vou guardar cada lugar teu

ancorado em cada lugar meu

e hoje apenas isso me faz acreditar

que eu vou chegar contigo

onde só chega quem não

tem medo de naufragar...

Mafalda Vega
Para A. Q.
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domingo, 14 de dezembro de 2008

Nós entre laçadas


foto: Inês

Quiero que sepas
una cosa.

Tú sabes cómo es esto:
si miro
la luna de cristal, la rama roja
del lento otoño en mi ventana,
si toco
junto al fuego
la impalpable ceniza
o el arrugado cuerpo de la leña,
todo me lleva a ti,
como si todo lo que existe,
aromas, luz, metales,
fueran pequeños barcos que navegan
hacia las islas tuyas que me aguardan.

Ahora bien,
si poco a poco dejas de quererme
dejaré de quererte poco a poco.

Si de pronto
me olvidas
no me busques,
que ya te habré olvidado.

Si consideras largo y loco
el viento de banderas
que pasa por mi vida
y te decides
a dejarme a la orilla
del corazón en que tengo raíces,
piensa
que en ese día,
a esa hora
levantaré los brazos
y saldrán mis raíces
a buscar otra tierra.

Pero
si cada día,
cada hora
sientes que a mí estás destinada
con dulzura implacable.
Si cada día sube
una flor a tus labios a buscarme,
ay amor mío, ay mía,
en mí todo ese fuego se repite,
en mí nada se apaga ni se olvida,
mi amor se nutre de tu amor, amada,
y mientras vivas estará en tus brazos
sin salir de los míos.

Pablo Neruda

sábado, 13 de dezembro de 2008

Gilza por detrás da Lua


São raros os dias em que não me lembro dela, nem que seja por alguns segundos, no antes de dormir, no momento da avaliação do dia e, principalmente, no de sonhar o amanhã. Mas sempre é uma coisa fugaz, um pensamento que vem e se assopra fora por si mesmo. Não tenho lembranças insistentes, só as que quero lembradas e as que me referenciam nessa vida que inaugurei depois que a morte nos separou.
Mas hoje foi diferente, hoje é data marcada, a ferro e brasa, em meu calendário perpétuo. E, hoje, com ela meio cicatrizada, estava eu no Frango, solitário como fazia muito tempo não me permitiam os chatos do lugar. Caderno em punho, cerveja gelada, Pipoca particularmente carente e demandante (sabia? às vezes penso que esses bichinhos são mais do que os supomos e sabem das coisas que nos vão pelas almas), IPod no ouvido,
Antonio (bela recomendação de Nina) para ler, a noite começava com uma tentativa de fazer dela uma outra noite no Frango, igual a tantas outras, só aproveitando a solidão, atualmente tão rara por lá, para deixar vazar os pensamentos e, quem sabe, algumas linhas escritas de que ando tão saudoso. O livro permaneceu fechado, os ouvidos atentos, mais ou menos flutuantes, a sede de sempre sendo aplacada, ela comigo naquilo que dela em mim restou.
De repente, assim sem que eu esperasse, uma baita lua cheia clareou o detrás das árvores que de lá se avistam. E a traquitana ipódica, meio como em combinação com os astros, começou a tocar Nana Caymmi, na Voz e Suor que gravou com César Camargo Mariano. Aí me rendi, cometi soneto, eu que vinha seco e mudo nas coisas da escrita.

O soneto já postei, no bom ou ruim que não me interessa, na certeza de tê-lo feito pra Lua, não a minha em Escorpião, mas aquela que me surgiu em Barão no dia da morte dela. Invadiu-me, a lua, os espaços de uma minha janela imaginária, a mesma que tanto me assombrou no logo após do acontecido, a mesma que me fez pensar, sempre, nessa mistura insólita do Desejo, Morte e Carambolas.
Pois a Lua fez-se, da maneira que só uma enorme lua cheia é capaz, anteparo da janela que, da Lua em diante, nunca mais restará aberta para um nada. A minha janela que não era mais a dela.
Aí, quando me dei conta do muito que havia mudado, do caminho já bem andado, da alma assossegada, Nana assoprou em meus ouvidos Isso e Aquilo. E percebi que, fosse como fosse, era ela quem cantava, isso e aquilo, sobre a ferida que não mais doía e a libertação das promessas que descumpri. E era ela, só podia ser ela.
Pois se dela aprendi as árias que não conhecia, a possibilidade da ópera que não tive tempo de saber saborear, Voz e Suor foi a disco que ela marcou de mim, desde o início de nosso conhecimento, CD que tocava com uma insistência que era só dela, no carro, na casa dela que depois virou um pouco minha, sempre que ela tinha a chance da escolha. Por isso, Isso e Aquilo soou como recado dela, como um cantar que vinha por lá detrás da lua cheia, falando da ferida que nunca mais doeu, nela.
Terminei sozinho na mesa do bar até ser delicadamente expulso por urgências que a isso tudo desconheciam. Em casa, com a Lua ainda anteparando a janela, compus o filme que aqui posto, esse Isso e Aquilo que ela me disse, só porque sempre gostou de mim. Pipoca parece que entendeu, se aquietou. Eu, me emocionei e vou pensar n´Isso.
Vocês? Sei lá.




sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Soneto da Lua Cheia


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A morte me jogou para a vida
A vida me tornou ao contrário
E a morte permaneceu ferida
Sangrando nos aniversários.
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Destes dois anos aqui passados
Só não passa a lembrança dela
Mas, hoje, de madrugada acordado
Uma lua me antepara a janela. .

E me espanta, invade, é cheia
Ilumina, impede e me convida
Para uma vida pra além da teia
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Onde a morte reste dormida
E a lua seja sempre candeia
Por todo o resto de minha vida.
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Em memória de Gilza
30 de outubro de 1950/12 de dezembro de 2006

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Cicatriz

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Dela tomei o gesto e o gosto torpe,
a tempestade e o sangue,
o grito surdo, a palavra muda,
o terror e o vulcão voraz
a infinita surpresa atônita

Nela, sorri felina verdade,
amargo encontro desencontrado,
o olhar negado, o recolhido gesto,
um antes acabado
em sabor de resto
e o oferecido pulso, cicatrizado.

Dela tomei a seiva rubra
escorrida, coagulada
e o colar sem pérolas,
tatuagem riscada;
a corda, o quase, e o talvez falhado.
Inconfidência enforcada,
vergonha, nudez, nada.

Dela inventei um gosto
roto,
de boca não beijada,
de solitário arrepio de um abraço
nunca dado;
a dor, o amor e o fracassado

Nela, restei e vi
a desistência,
e desisti de repetir
o acordar maldito,
o terror não escrito,
os pontos cegos.
E aprendi estranho Isso
que nela ouvi.

E nela, fiz-me
novamente again
pela primeira vez.
Insistência atenta,
tateares tontos,
bêbados passos,
precários equilibrares,
equivocado no oco
louco
que nela vi.

Por ela um eu passou-me
e fez-se pra trás, distante
deste outro mesmo agora diferente,
que o, dela, instante,
equilibra abismos,
e vive muito bem
dela pra frente.

Dela, guardo meu presente
e sou, eternamente,
do gesto heróico,
bardo redundante.

Por ela, sigo adiante.

E ela nela restou.
E dela só ela sabe o sabor
desta história dela
que em nós queimou.

Nela, aposto um risco
que, valendo-me a pena
será, dela, nosso petisco.

E, por ela, me arrisco!


Um dia qualquer do último setembro do último ano do século passado
Postado no final de fevereiro de 2007

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Anta lógica

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Se os poetas de verdade
Podem propor-se antologias,
Um poeta pela metade
Por que não poderia?

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

MEU AMOR ME AGARRA & GEME & TREME & CHORA & MATA

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Quando fui para o Rio em fevereiro de 1972, depois de um breve período na Rua Corrêa Dutra (onde escutei o Cais que aqui já postei), mudamos (Itiro, João, Sérgio Paulo e eu) para um apartamento na Rua Almirante Tamandaré. O apartamento era um daqueles típicos apartamentos antigos, da época que Flamengo e Catete eram bairros chiques; quatro quartos, sala enorme, ´ssas coisas que, em 1972, 3 estudantes de mestrado e um professor podiam sustentar sem que fosse um luxo. Nele realmente comecei a viver minha vida carioca, o deslumbre com as meninas, bem mais dadas do que haviam me acostumado as campineiras, o Filé à Francesa do Lamas (ainda no seu local original) e, confesso envergonhado, por pura preguiça, a Praia do Flamengo com suas águas já imundas.
Daquela época guardo inúmeras recordações, algumas inaugurações e, até mesmo, uma paixão. Eram outros tempos, quando só com minha bolsa de mestrado eu bancava gasolina do carro, os eventuais motéis (grande novidade que só fui conhecer no Rio), as cervejas e filés diários no Lamas, onde Firmino, nosso garçom, nos fazia furar fila e sempre dava um jeito para que não esperássemos muito por uma mesa.
Na esquina de casa, ou seja, na Almirante Tamandaré com Rua do Catete, havia uma pequna galeria, com lojinhas simples de todos os tipos. Em uma delas eu passava quase que diariamente para verificar as novidades em LP. Um dia comprei o LP de Jards Macalé que ilustra este post.
O Lp era um biscoito fino. Músicas de Macalé com Capinam (grande letrista que morreu muito jovem), com um grupo pequeno e super afiado de belos músicos. Foi neste LP que conheci Movimento dos Barcos, música que depois marcou de maneira definitiva meu adeus à vida de solteiro no Rio e minha mudança para a Senador Vergueiro onde havia alugado um apartamento para casar.
Anos mais tarde, quando ainda era suportável assistir o Programa do Jô Soares, escutei uma entrevista com Macalé. Como artista, Macalé sempre foi meio maldito, por não fazer concessões numa época em que as concessões foram se tornando quase que obrigatórias. Em um determinado momento, Macalé se refere ao LP em questão e afirma que, segundo a gravadora, foram vendidos só 14 exemplares do mesmo. Morri de orgulho de, pela primeira vez, estar em um tão seleto, e pequeno, grupo. Pena que o LP sumiu de mim junto com os outros quase 2.000 que já tive.
A música do filminho é do LP, composição de Macalé e Capinam, e sempre foi uma das minhas favoritas. Com ela descobri que meu amor não passava de um tigre de papel e me despedi do cais para seguir viagem no movimento dos barcos. Até hoje não aportei direito.
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segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Diminueto

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Minha pena é meu tinteiro
A mesa, meu tabuleiro.
Rabisco de próprio punho
Por inteiro sou rascunho.

domingo, 7 de dezembro de 2008

Fado

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Um amigo acaba de voltar de Portugal. Aliás, vários amigos têm voltado de Portugal. Alguns, entretanto, nunca voltaram já que, como diriam nossos amigos de lá, nunca foram. Mas, brincadeiras à parte, os que lá têm estado retornam encantados, com a terra, as gentes, a comida, etc. Mas esse amigo em particular voltou com uma sensação estranha: descobriu nos seus dias na terrinha que carrega um português dentro de si. E, como diz ele, esse português em seu peito é um homenzinho triste, meio melancólico, coisa que lhe assustou e desagradou um pouco. No entanto acredito que meu amigo só descobriu o que qualquer brasileiro com um pouco de sensibilidade acaba descobrindo quando se deixa levar pelos ares, aromas e músicas de Portugal.

Pois, livrar-se do português em nós, quem há de? Bem que tentamos esquecer nossas origens, a alma que herdamos, a língua que é deles e nos conforma, a saudade que nos orgulha enquanto palavra e nos marca todos os sentimentos. E, tem razão o amigo, o português é meio triste, assim melancólico, de olhos sempre voltados para o mar esperando o retorno de D. Sebastião, o que nunca virá. E disso diz bem a música que por lá se canta com as entranhas.
Claro que por aqui, sob esse sol tropical que nos espanta as tristezas mais sombrias, essa melancolia fica escondida no fundo bem fundo da alma brasileira, retemperada pelos índios e negros de nossa formação, pelas demais misturas, por nossa malandragem macunaímica, pelo infantil alegrinho que insistimos em ser. Mas, olhando bem, todos temos esse portuguesinho escondido em algum canto d´alma.
Eu, que já elaborei por aqui sobre o chorão em mim, redescubro a matriz onde se imprimiu o Chorão da casa do Bosque. E aceito meu fado.
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sábado, 6 de dezembro de 2008

Provérbio pró verbo.

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Morrer é fácil.
Difícil é ressuscitar.

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sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Primeiras letras

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Profunda idade

Nada como Pessoa, navegado qual Paulinho,
Faço do blog odisséia de onde retornarei.
Se ainda a tortos caminhos,
Ao se chegar me saberei.

Nas teias com que me tecem,
Nas sereias que enlouquecem,
No umbigo em escravidão,
Espero, que finda a jornada
Aqui já não reste nada,
Nem sonho, nem assombração.

Se hoje sou quase morto,
Se vivo, me erro torto,
Navego para um litoral
E blogo com todas as velas,
Pintando, em quase aquarelas,
Com tintas que sabem sal.

Nas areias que chegarei,
Não quero sexta, nem feira.
Retrato de Dorian Gray,
Em cinza, para não ser bandeira.

No meio de todos ausente,
Nas grades não verei prisão,
Que a verdade a gente mente
Pra, do eu, prestar a-tensão

De mim mesmo serei alcaide,
De meus desejos não saberei.
De Profundis, Oscar Wilde!
Salomé, viva meu rei!
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Bar do Frango, 14 de fevereiro de 2007

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Um soneto e um quarto

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Gostava de morar na tua pele
desintegrar-me em ti e reintegrar-me
não este exílio escrito no papel
por não poder ser carne em tua carne.

Gostava de fazer o que tu queres
ser alma em tua alma em um só corpo
não o perto e o distante entre dois seres
não este haver sempre um e sempre o outro.

Um corpo noutro corpo e ao fim nenhum
tu és eu e eu sou tu e ambos ninguém
seremos sempre dois sendo só um.

Por isso esta ferida que faz bem
este prazer que dói como outro algum
e este estar-se tão dentro e sempre aquém.

Manuel Alegre, Sete Sonetos e um Quarto
Para, com e de Inês
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quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Sexo é política ou Calabárbara


Um post leva ao outro nesse aleatório em que se estabelecem minhas carambolas, meu desejo e, ao fim, as mortes que me constroem. Da tatuagem anterior, sem perder o espírito, antigas politicagens encontram seu caminho. Ainda com o belo poema anterior em mente, brinquemos de fazer alguma política tardia, só para retornar, em música, versos e imagem, aos corpos tatuados, ao desejo de carne viva.
Em 1973, Chico e Ruy Guerra, brasileiro e português, escreveram Calabar, O Elogio da Traição. Falavam do papel relativo dos mocinhos e bandidos durante a ocupação holandesa de Pernambuco e arredores. Dos portugueses broncos e dos iluminados pelo Príncipe de Nassau. Coisa sérissima naqueles anos de chumbo dos militares "portugas" que nos salvavam a pátria. João Caetano, o teatro, pronto, a peça anunciada, o Rio antevia o Fado Tropical que lá se cantaria. A peça foi, é claro, absolutamente censurada, em nome da boa política e, principalmente, dos bons costumes.
Pois as músicas que ficaram, e que Chico teve que gravar em um Lp não chamado Calabar, mas Chico Canta e ponto (se me lembro bem, ainda comprei o LP com o nome Calabar impresso na capa; os milicos eram burros e meio lerdos), falavam de amores, bárbaros e bárbaras, de tatuagens, e de alguns "cala a boca"´s amorosos (Fado Tropical, pedido que um dia acatarei, é uma das poucas músicas diretamente políticas que permaneceram). Algumas das peças mais pungentes, sexualmente falando, da obra de Chico, vieram deste manifesto político que ficou calado para sempre. O político ficou mudo, para os que não sabiam escutar, mas a tatuagem marcou-se nas peles de nossos amores.
Ou seja, mais uma vez o sexual foi a revolução que não se calou, ou pelo contrário, foi aquilo que, em nós, fez-se calado, apesar da burrice da censura, da estupidez do moralismo que exercitava então. Alguém se lembra do general de plantão? Mas as marcas no corpo, que queriam ficar como tatuagem, até hoje estão impressas em nosso imaginário amoroso.
E, dada a postagem anterior, aqui venho demonstrar que política é desejo, o tesão revolucionário, e a fome dos corpos eterna.
O Brasil ainda será um enorme Portugal?
Ainda não existe pecado do lado de cá do Equador?
Quem calará a voz de Bárbara?
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Corações de mãe, arpões
Sereias e serpentes
Que te rabiscam
O corpo todo
Mas não sentes...

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terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Tatuagem

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Te propongo esta noche
llegar a un acuerdo,
un diálogo entre mi cuerpo y tu cuerpo
una conversación sin palabras,
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Te propongo un pacto de susurros,
una tertulia de gemidos,
un monólogo de gritos,
que todo lo que no dijimos
en la piel permanezca escrito...



Gloria Bosch

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Releituras



O Farol dos Olhos Teus

Na ilha onde me habito,

frequentam as gaivotas.
E trazem, presas aos bicos,
ao invés de folhas de louro,
mensagens, pequenas notas,
preciosos grãos de ouro.

Notícias do mar além,
onde em terras distantes
residem meus todos bens.
Bússolas de norte constante,
consolos deste ser errante,
avalistas de meu ser alguém.

E, nestes esperados instantes,
que me trazem as gaivotas,
ouço músicas, nunca o bastante,
fugas, prelúdios, gavotas,
doçuras para meus ouvidos,
alívio para um meu castigo.

Que aqui naufraguei por besteira,
pensando em uma vida nova.
Mas sem um meu sexta-feira,
escrevo essas poucas notas,
pobres versos em tom de trova,
que devolvo às gaivotas.

E assim, do Frango à Praça,
vou habitando esta ilha,
errando pelo rés da praia,
prisioneiro, meio sem graça,
desta imaginária Tordesilhas,
aguardando que o dia raia.

No movimento dos barcos,
da janela de meu quarto,
espio por detrás da porta,
ali onde Inês era morta,
onde sonho novo momento,
eu, ela, e todo o sentimento.

Invento um cais,
e quero mais.


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