quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Que há de ser de nós?/Travessia

Já viajamos de ilhas em ilhas
já mordemos fruta ao relento
repartindo esperanças e mágoas
por tudo o que é vento.

Já ansiamos corpos ausentes
como um rio anseia p´la foz
já fizemos tanto e tão pouco
que há-de ser de nós?

Que há-de ser do mais longo beijo
que nos fez trocar de morada
dissipar-se-á como tudo em nada?

Que há-de ser, só nós o sabemos
pondo o fogo e a chuva na voz
repartindo ao vento pedaços
que hão-de ser de nós.

Já avivamos brasas molhadas
no caudal da lágrima vã
e flutuando, a lua nos trouxe
à luz da manhã.

Reencontramos lágrimas e riso
demos tempo ao tempo veloz
já fizemos tanto e tão pouco
que há-de ser de nós?


Que há-de ser da mais longa carta
que se abriu, peito alvoroçado
devolver-se-á: «endereço errado?»

Que há-de ser, só nós o sabemos
pondo o fogo e a chuva na voz
repartindo ao vento pedaços
que hão-de ser de nós.

Já enchemos praças e ruas
já invocamos dias mais justos
e as estátuas foram de carne
e de vidro os bustos.

Já cantamos tantos presságios
pondo o fogo e a chuva na voz
já fizemos tanto e tão pouco
que há-de ser de nós?

Que há-de ser da longa batalha
que nos fez partir à aventura?
que será, que foi
quanto é, quanto dura?

Que há-de ser, só nós o sabemos
pondo o fogo e a chuva na voz
repartindo ao vento pedaços
que hão-de ser de nós.

Sérgio Godinho
(ver comentários)

3 comentários:

Anônimo disse...

Oi Zédu,

Li a poesia e acabei voando ao vídeo e com certeza me toquei muito e lá deixei o seguinte e sincero comentário:
Um vídeo verdadeiro que além de nos comover nos convoca à ação e à olhar o como ser vivente que clama por atenção na sua solidão , abandono , exclusão. Nada fazendo após um vídeo como este , é porque somos então muito mais miseráveis que qualquer uma pessoa nele mostrada. Porque temos em nós somente as possibilidades materiais , mas não as humanitárias. O vídeo é belíssimo e as imagens dizem da música: melodia-vozes-letra tão interligadas que provocam sem banalização da violência do sofrimento abjeto a emoção e o constrangimento sentido por todos como posso imaginar. A pergunta é por onde começar? E que seja de modo simples porem determinado. A busca pelo boca a boca ou por meio digital sempre nos mostrará como agir e a começar de micro espaços bem perto de nós até alcançarmos a grande rede humanitária de solidariedade que vai se interligando infinitamente como é necessário. Organizações, situações, abrigos, desabrigos, hospitais, ruas, sob os viadutos, enfim no mundo que não vemos de dentro da nossa plácida acomodação. Há infinitos lugares e não mais lugares onde alguém nos espera para continuar a sua caminhada de ser dignamente vivente. Parabéns a Sergio Godinho e aos demais que participaram da montagem do Vídeo...
Meire Coutinho
BR/MG/BH

Mas depois eu achei também lá um desenho lindo com a mesma música e que fala da questào ambiental ...de fato a pergunta fica em todos os sentidos; que há de ser de nós?

Beijo meu amigo?

Meire

Meire Coutinho
MG/BH

Zédu disse...

A proximidade dos 60 anda me fazendo esquecer coisas. Esse mesmo poema já tinha sido colocado há muito pouco tempo atrás, como me fez lembrar Tita. Deletei a postagem original (para manter o comentário da Meire aqui nessa).
Perdão, leitores!

Anônimo disse...

É vero que a gente esquece, mas do do que a gente não quer lembrar. Mas insisto que esta coisa dos quase sessenta mesmo que provoque alguns esquecimentos, que importa, se nem doem!!

Rindo aqui pq eu tinha percebido o fato da repetição da poesia, mas achado natural o que talvez tivesse sido motivado por outra qualquer circunstância.

Valeu pela atenção em deletar o primeiro e náo este onde está meu comentário.

bj/Meire