quarta-feira, 23 de maio de 2007

Abelardo e Heloísa


Quem um dia irá dizer que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer
Que não existe razão?
.
Eduardo abriu os olhos mas não quis se levantar
Ficou deitado e viu que horas eram
Enquanto Mônica tomava um conhaque
Noutro canto da cidade
Como eles disseram
.
Eduardo e Mônica um dia se encontraram sem querer
E conversaram muito mesmo pra tentar se conhecer
Um carinha do cursinho do Eduardo que disse
- Tem uma festa legal e a gente quer se divertir
Festa estranha, com gente esquisita
- Eu não tou legal, não agüento mais birita
E a Mônica riu e quis saber um pouco mais
Sobre o boyzinho que tentava impressionar
E o Eduardo, meio tonto, só pensava em ir pra casa
- É quase duas, eu vou me ferrar
.
Eduardo e Mônica trocaram telefone
Depois telefonaram e decidiram se encontrar
O Eduardo sugeriu uma lanchonete
Mas a Mônica queria ver o filme do Godard
Se encontraram então no parque da cidade
A Mônica de moto e o Eduardo de camelo
O Eduardo achou estranho e melhor não comentar
Mas a menina tinha tinta no cabelo
.
Eduardo e Mônica eram nada parecidos
Ela era de Leão e ele tinha dezesseis
Ela fazia Medicina e falava alemão
E ele ainda nas aulinhas de inglês
Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus
De Van Gogh e dos Mutantes
Do Caetano e de Rimbaud
E o Eduardo gostava de novela
E jogava futebol-de-botão com seu avô
Ela falava coisas sobre o Planalto Central
Também magia e meditação
E o Eduardo ainda estava
No esquema "escola, cinema, clube, televisão"
.
E, mesmo com tudo diferente
Veio neles, de repente
Uma vontade de se ver
E os dois se encontravam todo dia
E a vontade crescia
Como tinha de ser
.
Eduardo e Mônica fizeram natação, fotografia
Teatro, artesanato e foram viajar
A Mônica explicava pro Eduardo
Coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar
Ele aprendeu a beber, deixou o cabelo crescer
E decidiu trabalhar
E ela se formou no mesmo mês
Que ele passou no vestibular
E os dois comemoraram juntos
E também brigaram juntos, muitas vezes depois
E todo mundo diz que ele completa ela e vice-versa
Que nem feijão com arroz
.
Construíram uma casa uns dois anos atrás
Mais ou menos quando os gêmeos vieram
Batalharam grana e seguraram legal
A barra mais pesada que tiveram
.
Eduardo e Mônica voltaram pra Brasília
E a nossa amizade dá saudade no verão
Só que nessas férias não vão viajar
Porque o filhinho do Eduardo
Tá de recuperação
.
E quem um dia irá dizer que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer
Que não existe razão?

Legião Urbana

Composição: Renato Russo

Um comentário:

Inês Queiroz disse...

Zé, há uma crítica com um humor bastante ácido sobre a letra em questão, que rola na rede há algum tempo. Aí vai um dos trechos: ---
"Na ocasião de seu primeiro encontro, vemos Mônica impor suas preferências, uma constante durante toda a letra, em oposição a humilde proposta do afável Eduardo (O Eduardo sugeriu uma lanchonete mas a Mônica queria ver o filme do Godard.). Atitude esta, nada democrática para quem se julga uma liberal. Na verdade, Mônica é o que convencionou chamar de P.l.M.B.A. (Pseudo lntelectual Metida à Besta Associado), ou seja, intelectuerdas, alternativos e esquisitões vestidos de preto em geral, que acham todo filme americano é ruim e o que é bom mesmo é filme europeu, de preferência francês, preto e branco, arrastado pra caralho, e com bastantes cenas de baitolagem. Adolar Gangorra
www.adolargangorra.com.br/blog/
---
Em suma, os únicos versos não questionados pelo pseudo-crítico foram: "Quem irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer que não existe razão?". Eu respondo: é claro que não existe razão. Razão e coração não se bicam. São inimigos mortais. Eu já li esse conto várias vezes e sei como termina, rs rss...
Beijos,