sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Sampa

Mantenho com São Paulo uma relação longa e complicada. No início, nos meus tempos de criança, era quase uma cidade mítica para a qual eu ia na Maria-Fumaça que ligava Campinas à Estação da Luz. A curiosidade infantil me tingia a cara de preto, fruto da fumaça que em mim se tatuava a caminho de São Paulo (e que nem as broncas da mãe conseguiam evitar). A Luz era um outro mundo que já nem me lembro para onde me levava.
Depois, muitos anos depois, morei em Pinheiros durante todo o meu tempo politécnico. E São Paulo foi se apresentando um mistério, um lugar onde o menino, reizinho do Culto à Ciência, se perdia em um anonimato que Campinas havia me desacostumado. Com isso, passava a semana devida lá e corria, nos finais de semana, para Campinas, para a namorada, para os amigos que corriam para cá de outros lugares, para o Ponto Chic das putas e dos taxistas que nos acolhia, ruidosos depois dos namoros ainda nos portões. Fui aprendendo a dizer: Não gosto de São Paulo.
Aí, sumi no Rio de Janeiro e lá construí minha vida, minha família, meu desatino, meu fado e meu destino. Quando vinha a São Paulo, só via o trânsito difícil, a falta das montanhas, a ausência da maresia. E, dizia, odiava.
Bem mais tarde cheguei a morar em São Paulo novamente. Mas eram épocas sombrias que nunca me tiraram da Higienópolis onde me escondia. São Paulo? Pouco vi. Continuava me sentindo um carioca exilado, contra a vontade, nos cinzas da cidade que me recolhia. Um dia, na busca de minha vida, retornei ao Rio de onde nunca havia saído.
Depois, anos, séculos, depois, voltei para Campinas um quase eu, criei blog, inventei uma Praça, fui me fazendo meio campineiro, apesar do sotaque que insisto em não perder. São Paulo era logo ali, sem fantasmas, sem recusas, mas sem motivos.
De repente me vi frequentando a Bandeirantes como quem navegava pela Brasil em direção ao Fundão. Mas, São Paulo continuava um único ponto, complicado, difícil, onde fui sempre com receio de ir. De onde me despedia um sorriso e um convite para voltar que nunca chegava.
Hoje, gosto de acreditar, São Paulo se abre em sorriso e convites. Descubro outra Zona Sul, sem garotas a caminho do mar mas onde me espera um sofá bem mais franco. Descubro um centro, viadutos, vales, geografia. Descubro que em São Paulo as pessoas se descobrem. Descubro uma nova vontade de ir para São Paulo, um bom motivo.
Acabarei gostando? Sei lá. Mas sei que, sim ou não, isso só dirá de mim, nunca mais da cidade.


3 comentários:

Anônimo disse...

Zédu

"O coração tem razões que até a razão desconhece" ???????

um forte abraço

Anônimo disse...

Ei meu amigo,

Que saudade de você e que alegria em ver você se reconciliando com São Paulo, ou com a cidade pela qual motivos há para tal coisa.

Eu acho São Paulo onde estive muito poucas vezes o maior barato e acredito que o vivido dessas oportunidades marcaram o meu olhar sobre a cidade. Mas não sirvo muito como referência, porque até prova em contrário, eu me adaptaria a quase todos os lugares. Chego a pensar muito sobre o porque disso.

Um beijo saudoso de sua amiga.

Meire

Anônimo disse...

E então, meu amigo, você encontrou em São Paulo o sofá bem mais franco? Um sofá realmente sincero, que possa te acolher como você merece ser acolhido? Amigo querido, melhor não se sentar em qualquer assento. Os sofás enfeitados podem enganar tanto!
O que te desejo é um sofá no qual você possa sempre sentar-se sem amarras, sem mentiras, sem falta de correção. Um sofá sincero.Esse sim valeria a pena não é mesmo? Você ainda encontrará o seu, sem duvida, porque merece. Você sabe voltar atrás nas suas bobagens e isto é uma grande, enorme qualidade. Nem todos conseguem.
Abraço da amiga,
Magaly