Confesso que pequei! Vários pecados pequei. Alguns que permaneceram inconfessáveis até agora. Outros por culpa da memória traidora que nos embaralha as lembranças ao sabor de suas atuais significações. Pois a memória é um arquivo muito pouco confiável, como continuará sendo aqui mesmo, onde confessarei pecados, mortais e veniais, na minha relação com o jazz e com a forma como dele me apropriei.
Pois nunca expliquei bem como tudo começou, talvez até por pouco lembrar dos inícios deste amor que ainda carrego comigo até hoje, e que venho derramando aos poucos neste blog que me pertence e, portanto, me atura, as abobrinhas e as carambolas.
Em algum lugar do passado do blog eu disse que meu primeiro LP de jazz comprei, junto com Nina, na Livraria Brasil, ali na General Osório, então ponto chic das mercadorias culturais de uma Campinas que ainda tinha centro. Que o LP de Oscar Peterson com Clark Terry foi o primeiro que comprei é coisa que continuo sustentando como fato. Mas já não tenho muita certeza se ele foi o primeiro LP de jazz que tive e, de qualquer forma, ele pouco explica como o garoto bossa-nova de repente se viu gostando daquela música que não tocava nas rádios, não aparecia na TV Tupi, e só era falada na música do Carlos Lyra (Influência do Jazz). Aí Ramasco me manda essa recordação Youtúbica que me fez repensar como, e quando, começou esse meu namoro com a coisa jazzística. E me descubro nú e pecador, coisa que, como sabemos, é condição, no mais das vezes, para muito divertimento, principalmente aqui abaixo da linha do Equador.
Mas como não confio na memória, sempre lida no aqui e agora da mitologia que nos inventa, não sei se me enganei antes ou me enganarei agora. Coisa absolutamente irrelevante, não fosse eu o dono do pedaço e Pipoca meu cachorro His Master´s Voice (na realidade, meu melhor analista, já que sempre não me deixa esquecer que falo sozinho e que devo me virar com tudo que digo; ele não dá a mínima para meus dizeres e para os postes virtuais). Assim, retifico, no embalo das lembranças de hoje, as informações sobre minha educação jazzística e confesso que meu primeiro disco de jazz tornou-se meu por meios para lá de ilícitos.
O fato é que quando, em 1967, tive que me mudar para São Paulo por conta da engenharia que acabou me con-formando Poli-mórfico, morei alguns meses na casa/mansão de Tia Maria, mulher de João, lá na Rua Monte Alegre em Perdizes, enquanto procurava uma república para proclamar minha. Ramo rico da família nobre empobrecida dos castos Mendes, a casa de Tio João era uma enormidade do tamanho da São Paulo em que me meti. Além do mais, era cheia de coisas que Tio João trazia de suas constantes viagens para os Estados Unidos, coisa rara na época, mesmo para os padrões da burguesia brasileira mais bem situada. Mas o fato é que, na casa dos primos ricos, havia uma coleção razoável de Lp´s importados, muitos deles jazzísticos. E talvez tenha sido lá, na solidão em que havia me metido naquela casa enorme, no meio daquela cidade mais enorme ainda, que dediquei horas de solidão para ouvir aquelas novidades em forma de música no aparelho mais Hi-Fi que até então tinha visto. E, talvez, sempre talvez, tenha sido lá que me apaixonei pelo jazz.
Não me lembro de outros discos de jazz que lá houvessem, mas com certeza os havia e, eu, os ouvia. Os discos não eram, com toda a certeza, coisas do gosto do Tio, mais provável que fossem restos deixados para trás dos primos mais velhos já casados (a família era cheia de primos e primas, alguns velhíssimos para os meus olhos de velho adolescente, e uns poucos mais ou menos da minha idade que ainda habitavam o pedaço, mas que quase nunca estão nas imagens que guardei daqueles meses). Os primos ainda residentes, mais ou menos da minha idade, como já disse, não eram particularmente chegados nos discos que fui descobrindo por lá (eram, me lembro agora, assim como eu, mais ligados nas gravações do CPC da UNE, no Subdesenvolvido, na paródia da Garota de Ipanema (olha que coisa mais linda/cheio de graxa/é ele operário...), ´ssas coisas engajadas que ecoavam do Rio de Janeiro em 1967, ano que, não sabíamos, antecederia o 68 que nunca acabou direito para toda uma geração). Mas sozinho na sala, livre de qualquer outro eleito censor, deixei o sensor em mim navegar nos tempos, ritmos e batidas do jazz, bossa já velha lá na terra onde nascera, mas novidade para meus ouvidos perdidos no entreato do cultocientífico ao politécnico no palco da solidão paulistana.
Haveriam outros discos, ou o jazz por lá largado por algum primo mais velho se resumia ao Time Out de Dave Brubeck? Não faço a menor idéia. Só sei que o LP me fascinou, principalmente a faixa Take Five, composição que ficou muito famosa pelo métrica a cinco tempos, coisa bem pouco característica do jazz (como só descobri depois), pelo sax de Paul Desmond (o sax até hoje é meu chorão preferido no jazz) e que, hoje, é verbete da Wikipédia (confiram). O certo é que me apaixonei pelo disco, que desejei abandonado e esquecido por algum primo já partido. Hoje já nem gosto tanto assim do Dave Brubeck, meio branco demais para o jazz, mas eu mesmo ainda era muito branquinho naquela época, como era a coisa bossa-nova (apesar de Nara Leão, em Opinião, ter nos apresentado o samba, o negro nas raízes, o nordestino de vida seca, anos antes, em 1964; mas o samba ainda era uma curiosidade antropológica, uma postura politicamente correta, jamais uma identificação do nacional em cada um de nós e muito menos um gosto musical verdadeiro). O fato é que gamei no disco do Brubeck e, supondo-o abandonado, adotei-o. Ou em outras palavras, passei a mão no dito e, num dos finais de semana de retorno à Campinas, levei-o comigo e nunca devolvi.
O clipe a seguir é a música que me fez ladrão, com seus intérpretes originais. Que os primos me perdoem.
Pois nunca expliquei bem como tudo começou, talvez até por pouco lembrar dos inícios deste amor que ainda carrego comigo até hoje, e que venho derramando aos poucos neste blog que me pertence e, portanto, me atura, as abobrinhas e as carambolas.
Em algum lugar do passado do blog eu disse que meu primeiro LP de jazz comprei, junto com Nina, na Livraria Brasil, ali na General Osório, então ponto chic das mercadorias culturais de uma Campinas que ainda tinha centro. Que o LP de Oscar Peterson com Clark Terry foi o primeiro que comprei é coisa que continuo sustentando como fato. Mas já não tenho muita certeza se ele foi o primeiro LP de jazz que tive e, de qualquer forma, ele pouco explica como o garoto bossa-nova de repente se viu gostando daquela música que não tocava nas rádios, não aparecia na TV Tupi, e só era falada na música do Carlos Lyra (Influência do Jazz). Aí Ramasco me manda essa recordação Youtúbica que me fez repensar como, e quando, começou esse meu namoro com a coisa jazzística. E me descubro nú e pecador, coisa que, como sabemos, é condição, no mais das vezes, para muito divertimento, principalmente aqui abaixo da linha do Equador.
Mas como não confio na memória, sempre lida no aqui e agora da mitologia que nos inventa, não sei se me enganei antes ou me enganarei agora. Coisa absolutamente irrelevante, não fosse eu o dono do pedaço e Pipoca meu cachorro His Master´s Voice (na realidade, meu melhor analista, já que sempre não me deixa esquecer que falo sozinho e que devo me virar com tudo que digo; ele não dá a mínima para meus dizeres e para os postes virtuais). Assim, retifico, no embalo das lembranças de hoje, as informações sobre minha educação jazzística e confesso que meu primeiro disco de jazz tornou-se meu por meios para lá de ilícitos.
O fato é que quando, em 1967, tive que me mudar para São Paulo por conta da engenharia que acabou me con-formando Poli-mórfico, morei alguns meses na casa/mansão de Tia Maria, mulher de João, lá na Rua Monte Alegre em Perdizes, enquanto procurava uma república para proclamar minha. Ramo rico da família nobre empobrecida dos castos Mendes, a casa de Tio João era uma enormidade do tamanho da São Paulo em que me meti. Além do mais, era cheia de coisas que Tio João trazia de suas constantes viagens para os Estados Unidos, coisa rara na época, mesmo para os padrões da burguesia brasileira mais bem situada. Mas o fato é que, na casa dos primos ricos, havia uma coleção razoável de Lp´s importados, muitos deles jazzísticos. E talvez tenha sido lá, na solidão em que havia me metido naquela casa enorme, no meio daquela cidade mais enorme ainda, que dediquei horas de solidão para ouvir aquelas novidades em forma de música no aparelho mais Hi-Fi que até então tinha visto. E, talvez, sempre talvez, tenha sido lá que me apaixonei pelo jazz.
Não me lembro de outros discos de jazz que lá houvessem, mas com certeza os havia e, eu, os ouvia. Os discos não eram, com toda a certeza, coisas do gosto do Tio, mais provável que fossem restos deixados para trás dos primos mais velhos já casados (a família era cheia de primos e primas, alguns velhíssimos para os meus olhos de velho adolescente, e uns poucos mais ou menos da minha idade que ainda habitavam o pedaço, mas que quase nunca estão nas imagens que guardei daqueles meses). Os primos ainda residentes, mais ou menos da minha idade, como já disse, não eram particularmente chegados nos discos que fui descobrindo por lá (eram, me lembro agora, assim como eu, mais ligados nas gravações do CPC da UNE, no Subdesenvolvido, na paródia da Garota de Ipanema (olha que coisa mais linda/cheio de graxa/é ele operário...), ´ssas coisas engajadas que ecoavam do Rio de Janeiro em 1967, ano que, não sabíamos, antecederia o 68 que nunca acabou direito para toda uma geração). Mas sozinho na sala, livre de qualquer outro eleito censor, deixei o sensor em mim navegar nos tempos, ritmos e batidas do jazz, bossa já velha lá na terra onde nascera, mas novidade para meus ouvidos perdidos no entreato do cultocientífico ao politécnico no palco da solidão paulistana.
Haveriam outros discos, ou o jazz por lá largado por algum primo mais velho se resumia ao Time Out de Dave Brubeck? Não faço a menor idéia. Só sei que o LP me fascinou, principalmente a faixa Take Five, composição que ficou muito famosa pelo métrica a cinco tempos, coisa bem pouco característica do jazz (como só descobri depois), pelo sax de Paul Desmond (o sax até hoje é meu chorão preferido no jazz) e que, hoje, é verbete da Wikipédia (confiram). O certo é que me apaixonei pelo disco, que desejei abandonado e esquecido por algum primo já partido. Hoje já nem gosto tanto assim do Dave Brubeck, meio branco demais para o jazz, mas eu mesmo ainda era muito branquinho naquela época, como era a coisa bossa-nova (apesar de Nara Leão, em Opinião, ter nos apresentado o samba, o negro nas raízes, o nordestino de vida seca, anos antes, em 1964; mas o samba ainda era uma curiosidade antropológica, uma postura politicamente correta, jamais uma identificação do nacional em cada um de nós e muito menos um gosto musical verdadeiro). O fato é que gamei no disco do Brubeck e, supondo-o abandonado, adotei-o. Ou em outras palavras, passei a mão no dito e, num dos finais de semana de retorno à Campinas, levei-o comigo e nunca devolvi.
O clipe a seguir é a música que me fez ladrão, com seus intérpretes originais. Que os primos me perdoem.
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