"Bem ... Freud nos diz, repetidamente, que a sublimação é também satisfação da pulsão, sendo que ela ... é inibida quanto a seu alvo... ela não o atinge. A sublimação é, entretanto, satisfação da pulsão, sem recalque. Em outras palavras, no momento eu não estou trepando, estou falando para vocês. Bem! Eu posso ter exatamente a mesma satisfação como se estivesse trepando ... e isso levanta a questão se, de fato, eu estou ou não trepando nesse momento"
quarta-feira, 30 de maio de 2007
Tudo que eu sempre quis dizer aos meus alunos, e nunca disse.
"Bem ... Freud nos diz, repetidamente, que a sublimação é também satisfação da pulsão, sendo que ela ... é inibida quanto a seu alvo... ela não o atinge. A sublimação é, entretanto, satisfação da pulsão, sem recalque. Em outras palavras, no momento eu não estou trepando, estou falando para vocês. Bem! Eu posso ter exatamente a mesma satisfação como se estivesse trepando ... e isso levanta a questão se, de fato, eu estou ou não trepando nesse momento"
terça-feira, 29 de maio de 2007
Diferença e Repetição
"...ao escrevermos, como evitar que escrevamos sobre aquilo que não sabemos ou que sabemos mal? É necessariamente neste ponto que imaginamos ter algo a dizer. Só escrevemos na extremidade de nosso próprio saber, nessa ponta extrema que separa nosso saber e nossa ignorância, e que transforma um no outro... Suprir a ignorância é transferir a escrita para depois ou, antes, torná-la impossível."
Infanto juvenil
segunda-feira, 28 de maio de 2007
Carne a-dentro
destas às moças,
uma história tonta
que aqui se conta.
Mas verá o leitor
que no fim de tudo,
resta um amor
obrigado mudo.
.
Vou abandonar o Frango
pelas coxinhas.
Espero que, lá, o rango,
quer dizer, galinhas,
se demonstrem mais dignas
desta troca ousada,
e me espetem insígnias
pela decisão tomada.
Abandono os machos,
frangos, frangotes,
para me gastar no escracho
dos meus velhos botes.
Quero coxas, coxões e sobrecoxas,
para fazer valer, enfim,
esta coisa roxa
que cacareja em mim.
Adeus Frango querido,
benvinda Coxinha minha!
Salve, salve, minha outra vida,
reapareço, desaparecido!
logo ali, numa outra esquina,
da sempre mesma pracinha.
Ali beberei as cevas que acolá eu tinha,
esquecerei os machos que por lá dormiam,
e far-te-ei Pasárgada, Coxinha minha,
ao encontrar as frangas que me comiam.
Do Frango a ti, será que errei?
Mas se és Pasárgada,
lá sou amigo do rei,
que mulheres me guarda,
e escolherei.
Delirante em ato,
só por escolha,
evito o farto, e o fato
de que esta outra bolha,
é fogo fátuo
de meu desejo errante.
Mas sigo adiante,
para além do Frango
uma Coxinha me espera.
Cansei do tango,
viva a quimera!
E do Frango às coxas,
e da suposta ousadia,
resto sem dança,
fico sem moças,
me agarro à lembrança
da anatomopatologia.
E por aqui eu resto e fico,
índio na oca,
com o dela Tico,
meu São Pipoca.
E só falta um nada
para ser Seu Zé
e retomar minha trilha;
é o Zé Mané
e a Sacra Família.
Cordel filosófico
Sócrates, velho biruta,
para falar de verdade,
dançou e tomou cicuta.
Já Einstein, gênio novo,
provou a relatividade,
e mostrou a língua pro povo.
O buraco que somos se segura nas mal traçadas linhas que nos circun-escrevem.
Uma das questões mais interessantes da psicologia das últimas décadas é a seguinte: em que medida o sofrimento psíquico de um sujeito deve ser relacionado com um defeito de sua percepção e de seu entendimento do mundo? Obviamente, a pergunta é relevante só quando o sofrimento é uma condição severa e duradoura.
Tomemos, por exemplo, a depressão, um estado patológico que, em princípio, não nos torna delirantes nem alucinados. "Ser" depressivo (diferentemente de "estar" deprimido) significa passar, ao longo da vida, por vários episódios de depressão profunda e sofrer de uma constante dificuldade em encontrar a vontade de viver.
Pois bem, será que ser depressivo implica (como causa ou como efeito) um erro de percepção e de pensamento? Qualquer terapeuta gostaria que fosse assim: bastaria corrigir o erro e, com isso, quem sabe a depressão fosse "curada". Se você é depressivo e enxerga o mundo como a brincadeira sádica de um deus maléfico, talvez você seja vítima dessa visão "errada". Ao corrigi-la com as palavras certas, a gente transformaria seu humor de vez, faria de você outra pessoa. Mas sobra a pergunta: será mesmo que, por você ser depressivo, sua percepção do mundo está errada?
Em 1979, foi publicada uma experiência (Abramson e Alloy, "Journal of Experimental Psychology", vol. 108, nº 4), na qual dois grupos de sujeitos (os deprimidos e os "saudáveis") deviam descobrir se suas ações tinham ou não alguma influência sobre uma lâmpada que, de fato, se acendia e se apagava ao acaso. Os não-deprimidos, apesar dos desacertos, concluíram que suas ações eram eficazes. Os deprimidos concluíram (corretamente) que suas ações não tinham eficácia nenhuma e que não havia como fazer a cabeça da maldita lâmpada.
Para alguns críticos, a experiência demonstrava apenas o pessimismo dos deprimidos. Mas resta que, no caso, a conclusão dos deprimidos foi certeira; portanto caberia salientar o extravagante otimismo que extraviou os não-deprimidos e constatar o realismo dos deprimidos. Aliás, a questão levantada pela experiência de 79 entrou para a história da psicologia como problema do "realismo depressivo" (há novas experiências publicadas no recente vol. 134 do "Journal of Experimental Psychology").
O interesse desse debate não é só clínico. Acaba de sair um livro imperdível, "Lincoln's Melancholy: How Depression Challenged a President and Fueled His Greatness" (a melancolia de Lincoln: como a depressão desafiou um presidente e alimentou sua grandeza), de Joshua Wolf Shenk.
Shenk se baseia nos relatos dos que foram próximos de Abraham Lincoln para confirmar que ele foi clinicamente deprimido durante a vida toda. Logo, o autor se pergunta se essa depressão grave e crônica constituiu um impedimento ou se, ao contrário, foi uma vantagem na conduta do presidente americano durante a Guerra de Secessão.
Ora, Shenk argumenta de maneira convincente que a depressão de Lincoln foi responsável por suas qualidades de estadista. A seguir, alguns exemplos:
1) A depressão clínica é sempre acompanhada por um intenso processo de pensamento: reavaliação contínua da realidade, dúvidas sobre a ação certa, exame constante de consciência e por aí vai. Esse processo leva o sujeito a um conhecimento especial das contradições de sua própria alma e da dos outros. Na vida pública, isso permite negociar sem desprezo pela parte adversa.
2) O deprimido que ultrapassa suas crises sem sucumbir tem, em regra, a coragem e a capacidade de encontrar motivações sem recorrer a grandes princípios (o que pediria um entusiasmo que é impossível na depressão). Lincoln, embora convencido de que a abolição da escravatura fosse moralmente correta, nunca invocou a certeza de que Deus estaria do seu lado, mas alegava (inclusive por escrito) que, quanto a Deus, cada lado podia considerá-lo seu aliado. É uma outra qualidade crucial para a vida pública, a não ser que a gente prefira entregar as rédeas do governo a iluminados e fundamentalistas.
3) A adversidade, para o deprimido, é, por assim dizer, natural (nada existe sem antagonismo). Deparar-se com oposição e derrota é, para ele, uma travessia normal. O resultado é a perseverança.
Recentemente, uma psiquiatra (Kay Redfield Jamison, "Touched with Fire: Manic Depressive Illness and the Artistic Temperament", tocados pelo fogo: a doença maníaco-depressiva e o temperamento artístico) mostrou que uma cura apressada da depressão nos privaria de inúmeros talentos artísticos e literários. Shenk estende o mesmo princípio a uma figura política; ele mostra que, no caso de Lincoln, a depressão não foi "uma falha de caráter que desqualificaria a liderança de um sujeito". Longe de comprometer o pensamento e as decisões do presidente, ela foi o traço de caráter que fez dele o estadista lúcido e necessário num momento sombrio da história de seu país.
Em suma, muitas aventuras dolorosas da mente são partes da subjetividade de quem sofre e, às vezes, partes irrenunciáveis, cuja "cura" deixaria o mundo mais pobre e mais estúpido.
@ - ccalligari@uol.com.br
sexta-feira, 25 de maio de 2007
Cantiga para não morrer (Ferreira Gullar)
Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.
Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.
Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.
E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento
Tesão de tese - "Pré-versão ou a-versão do avesso"
ÍNDICE
Immissio membri homini ...
Parte A - Gêneses/Geração
Normalidade/De perto todo mundo é normal .......................
Normalidades/O avesso do avesso..........................................
Normatividade/De volta ao futuro .........................................
Antiguidades/A Pré-versão de Freud....................................
Parte B - Batismo/Nomeação
Fundamentos/Padrinhos e demais convidados.....................
Escritura/Tirando de letra.......................................................
Identificação/Anima-l de Z-eus..............................................
Sintoma/Quem pariu Mateus que o embale.........................
Parte C - Crisma/Confirmação
(Dis)Concordâncias/O outro é um eu em si...........................
Respostas/Luzes na ribalta......................................................
Questões/Vergangenheitsbewältigung...................................
E daí?/Eu sei, mas mesmo assim ...........................................
... in vaginam feminae.
quinta-feira, 24 de maio de 2007
O impossível homem sem qualidades
quarta-feira, 23 de maio de 2007
Pecado original
Sou filho de homem e mulher, segundo o que me disseram. Isto me espanta... acreditava ser muito mais.
,
Abelardo e Heloísa
Quem um dia irá dizer que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer
Que não existe razão?
.
Eduardo abriu os olhos mas não quis se levantar
Ficou deitado e viu que horas eram
Enquanto Mônica tomava um conhaque
Noutro canto da cidade
Como eles disseram
.
Eduardo e Mônica um dia se encontraram sem querer
E conversaram muito mesmo pra tentar se conhecer
Um carinha do cursinho do Eduardo que disse
- Tem uma festa legal e a gente quer se divertir
Festa estranha, com gente esquisita
- Eu não tou legal, não agüento mais birita
E a Mônica riu e quis saber um pouco mais
Sobre o boyzinho que tentava impressionar
E o Eduardo, meio tonto, só pensava em ir pra casa
- É quase duas, eu vou me ferrar
.
Eduardo e Mônica trocaram telefone
Depois telefonaram e decidiram se encontrar
O Eduardo sugeriu uma lanchonete
Mas a Mônica queria ver o filme do Godard
Se encontraram então no parque da cidade
A Mônica de moto e o Eduardo de camelo
O Eduardo achou estranho e melhor não comentar
Mas a menina tinha tinta no cabelo
.
Eduardo e Mônica eram nada parecidos
Ela era de Leão e ele tinha dezesseis
Ela fazia Medicina e falava alemão
E ele ainda nas aulinhas de inglês
Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus
De Van Gogh e dos Mutantes
Do Caetano e de Rimbaud
E o Eduardo gostava de novela
E jogava futebol-de-botão com seu avô
Ela falava coisas sobre o Planalto Central
Também magia e meditação
E o Eduardo ainda estava
No esquema "escola, cinema, clube, televisão"
.
E, mesmo com tudo diferente
Veio neles, de repente
Uma vontade de se ver
E os dois se encontravam todo dia
E a vontade crescia
Como tinha de ser
.
Eduardo e Mônica fizeram natação, fotografia
Teatro, artesanato e foram viajar
A Mônica explicava pro Eduardo
Coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar
Ele aprendeu a beber, deixou o cabelo crescer
E decidiu trabalhar
E ela se formou no mesmo mês
Que ele passou no vestibular
E os dois comemoraram juntos
E também brigaram juntos, muitas vezes depois
E todo mundo diz que ele completa ela e vice-versa
Que nem feijão com arroz
.
Construíram uma casa uns dois anos atrás
Mais ou menos quando os gêmeos vieram
Batalharam grana e seguraram legal
A barra mais pesada que tiveram
.
Eduardo e Mônica voltaram pra Brasília
E a nossa amizade dá saudade no verão
Só que nessas férias não vão viajar
Porque o filhinho do Eduardo
Tá de recuperação
.
E quem um dia irá dizer que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer
Que não existe razão?
Legião Urbana
Composição: Renato Russo
segunda-feira, 21 de maio de 2007
Stabat Mater
Se ao menos esta dor servisse,
se ela batesse nas paredes,
abrisse portas, falasse,
se ela cantasse e despenteasse os cabelos.
.
Se ao menos esta dor visse,
se ela saltasse fora da garganta,
como um grito,
caísse da janela, fizesse barulho,
morresse.
.
Se a dor fosse um pedaço de pão duro
que a gente pudesse engolir com força
depois cuspir a saliva fora,
sujar a rua, os carros, o espaço, o outro
esse outro escuro que passa indiferente
e que não sofre e tem o direito de não sofrer.
Se a dor fosse só a carne do dedo
que se esfrega na parede de pedra
para doer visível,
doer penalizante,
doer com lágrimas.
O Grito - RENATA PALLOTTINI
[A Faca e a Pedra. São Paulo: Brasil Editora, 1965]
quarta-feira, 16 de maio de 2007
Para A, de todas as letras
.
.
sábado, 12 de maio de 2007
Una furtiva lacrima
negli occhi suoi spuntò.
Quelle festose giovani
invidiar sembrò.
Che più cercando io vo?
Che più cercando io vo?
M'ama, mi sta amando, vedo.
Io vedo.
Un solo istante i palpiti
del suo bel cor sentir.
I miei sospir confondere
per poco ai suoi sospir.
I palpiti,
i paliti sentir.
Confondere i miei
coi suoi sospir
Cielo, si può morir.
Di più non chiedo, non chiedo.
Oh cielo, si può, si può morir.
Di più non chiedo, non chiedo.
Si può morir,
si puo morir d'amor.
Entradas e Bandeiras
que ao impedir da concha a doente pérola
me permite saber, da enrugada ostra,
o sumo d´elas e o sabor das carnes.
.
E com a droga de vida tomada na veia,
na boca o gosto de minhas carambolas,
em nau fragata, de velas postas,
parto no agora que antes foi tarde.
.
II
Esqueço a pérola, retenho a concha,
e vou, ao avesso, garimpar meus diamantes.
Pescador não sou, sou bandeirantes.
Volto ao começo, caio na estrada.
No passado deixo o que me é distante,
e vou caçar futuros em novas entradas.
E nessas entradas de Compostela,
sexta-feira, 11 de maio de 2007
A Ópera do fantasma
Las Meninas
Tupi ou not Tupi
.
.
.
De verborrágica escrita
aos versos concisos,
sina mal dita
ou final do juízo?
.
Do texto à frase,
da frase às letras.
Brinco com as crases
Versos pernetas
Da Ma, assim cunhada, mas que me foi sempre boa
quatro faces ao menos teria,
para cada amor um quadrante
nova, cheia, crescente ou minguante
.
Para celebrar o amor, Cheia
calar a voz do sofrer distante
derramaria lágrimas de estrelas
banhando de luz o coração amante
.
Sobre a terra arada e fértil
grão alimento, fruto a nascer
forte energia teria na Nova
para lançar a sorte ao entardecer
.
Ao ver no chão a semente brotando
cachos de uva e cabelo abundante
no milho,na cabeça na roça
sol escaldante
suor nas têmporas, trabalho persistente
muito prazer sou a Crescente.
O gabinete do Dr. Lacan
terça-feira, 8 de maio de 2007
Reflexão freudiana
Rafael, Azeitona, Helinho
barangas simpáticas,
ou por demais apáticas,
na mesa escrevinho,
e observo a pátria,
onde errei sozinho.
Aos caros amigos
Ai, ais
segunda-feira, 7 de maio de 2007
Os Espelhos de Borges,
no sólo ante el cristal impenetrable
donde acaba y empieza, inhabitable,
un imposible espacio de reflejos
.
sino ante el agua especular que imita
el otro azul en su profundo cielo
que a veces raya el ilusorio vuelo
del ave inversa o que un temblor agita
.
Y ante la superficie silenciosa
del ébano sutil cuya tersura
repite como un sueño la blancura
de un vago mármol o una vaga rosa,
.
Hoy, al cabo de tantos y perplejos
años de errar bajo la varia luna,
me pregunto qué azar de la fortuna
hizo que yo temiera los espejos.
.
Espejos de metal, enmascarado
espejo de caoba que en la bruma
de su rojo crepúsculo disfuma
ese rostro que mira y es mirado,
.
Infinitos los veo, elementales
ejecutores de un antiguo pacto,
multiplicar el mundo como el acto
generativo, insomnes y fatales.
.
Prolonga este vano mundo incierto
en su vertiginosa telaraña;
a veces en la tarde los empaña
el Hálito de un hombre que no ha muerto.
.
Nos acecha el cristal.Si entre las cuatro
paredes de la alcoba hay un espejo,
ya no estoy solo. Hay otro. Hay el reflejo
que arma en el alba un sigiloso teatro.
.
Todo acontece y nada se recuerda
en esos gabinetes cristalinos
donde, como fantásticos rabinos,
leemos los libros de derecha a izquierda.
.
Claudio, rey de una tarde, rey soñado,
no sintió que era un sueño hasta aquel día
en que un actor mimó su felonía
con arte silencioso, en un tablado.
.
Que haya sueños es raro, que haya espejos,
que el usual y gastado repertorio
de cada día incluya el ilusorio
orbe profundo que urden los reflejos.
.
Dios (he dado en pensar) pone un empeño
en toda esa inasible arquitectura
que edifica la luz con la tersura
del cristal y la sombra con el sueño.
.
Dios ha creado las noches que se arman
de sueños y las formas del espejo
para que el hombre sienta que es reflejo
y vanidad. Por eso no alarman.
domingo, 6 de maio de 2007
Repetição insistente
Paraíso Perdido
Me diz quanto!
Quanto você quer,
quanto exigirá,
para me dar
esse umbigo que bóia
nesse liso mar
de pele.
Quanto
para minha língua explorar,
esse buraco com fundo,
essa marca recolhida,
negativo botão de rosa,
lugar do corte
que te fez formosa.
Quantas maçãs,
quantos mil-réis,
que carnes minhas,
deposito a teus pés?
Te pago as contas,
te apago as penas,
de meu Sansão,
te dou melenas,
de meu João,
minha cabeça?
Não cobro a costela,
não me faço dono,
meus direitos não retomo,
esqueço as outras elas.
Me diz!
Pago!
E te lamberia,
com língua ofídica,
tomando em mim,
de Eva,
o melhor presente.
E deixando de lado
Adão e o pecado,
encantar-me-ia
serpente.
sábado, 5 de maio de 2007
Delireu
A escrita, por outro mesmo lado: os traços são dele, mas nela lhe traço, pois o traço é eu. E lhe traço o eu lá dele, mas sendo eu, desde os começos quando ele apareceu, num estalo precipitado quando pensou ser eu. Desde então ele me supõe, um eu lá dele, que não sou eu, que me imponho a ele e o faço meu. Coisa que muitos outros eus acabam não conseguindo, e somem nas sombras dos eles deles, que viram do Outro, que não é Eu.
Cansativo, não é mesmo? Daí que a maioria fica na mansidão do terror do Outro, que só assusta lá as negas dele, grama-ticando o eu no bom comportamento da pouca linguagem, no eu retórico que não sou eu nem ele, lisonja de um bem dizer que não nos diz nem nada. Graças a eu, não é o caso dele. Até que ele tenta assossegar-se nos Outros que os outros lhe emprestam, mas sou mais eu, e remonto o furo desses Outros dos outros do eu, deles, distante. Pois furo é furo, tudo igual. Desmonto, demonstro, e lhe imponho meu, again and again, olho no olho, eye no I, as you can say. Coisa de doido, é o que pensam muitos, os do Outro, que não sou eu.
Mas vamos levando, sempre a bailar, pois se parar o Outro pega, se correr lhe come o Outro, coisa dos outros doidos, pois todos são. Ele e os outros, cada qual com a sua doideira. Sem contar os doidos doidos, os eus sem eles, ou eles sem nem sombra de eu.
E vamos, deslizando sempre, mas muito bem acompanhados. Cheio d´eus famosos, é só saber olhar. Oscar Wilde, Foucault, Genet, Mishima, nenhum doidão, apesar de doidões também ter vários, inclusive esses próprios, de vez em quando. Pega o Van Gogh, o Bispo do Rosário, e tantos outros mais, que muito sofreram nessa de eu meio sem ele pra botar no mundo do Outro, rei da linguagem, mãe de todos e dono da bola do jogo que temos de jogar se não queremos perder orelhas ou acabar na Juliano Moreira. Sem contar os tantos outros pares impossíveis de ele e eu, como ele e eu, que deslizam anônimos provocando eles lá na linguagem do Outro deles. Porque, que fique aqui bem dito, eles, os outros, são todos iguais. Já eu e ele somos só eu e ele, mesmo quando me finjo nele no mundo deles. Daí não termos par, nem paz, apesar de vivermos tentando cumplicidades que nunca duram, dada nossa diferença. Mas, me entenda, nós não somos diferentes deles, já que diferentes todos se supõem, e são num assim dizer. Nós somos, ele e eu, pura diferença, o que é completamente diferente. Pois eu sou eu, ele é ele, ele é d´eu, e eu sou traço, troço, que lhe marca meu.
O que eu quero com tudo isso? Não sou de mais querer, que isso é coisa dele, já que meu querer é ele, e ele é d´eu. Onde isso nos leva? Não sou de chegar, sou puro de vagar de porto a porta, e vice versa que nunca é só ao contrário, de lá para acolá, que cá sempre já era, como o rio que passa e insisto, eu mesmo, em ver igual. Pura metonímia, sacou? Tava procurando metáfora? Ele sente muito, e eu lhe aconselho: tente no shopping, tá cheio delas, algumas até bem engraçadinhas. Aliás, nada contra as metáforas, das quais abuso na boca dele, que o jogo é esse e o sucesso é uma delícia. Prá bem dizer, adoro uma metáfora, mas só para escorregar depressinha prá outra. Metaforonímico, como dizem eles por detrás dos eus lá deles.
Eu vou ficando, que na escrita é onde mais me arrisco, pois só na busca inútil existo e aqui me fixo, meu horror confesso. Mas ele estará por aí, onde eu o arrastar. Pois agora vocês sabem: lá onde ele está, quem manda é eu, pois eu não sou ele, mas ele é eu. Nunca se engane, por trás daquele olhar lá dele, me encontro eu. E muito cuidado, pois eu sou foda, mas quem fode é ele (e se fode muito, pois ele é meu e eu, já disse, sou pura foda de se meteu). Pois vai daí que você gama n´eu, e tem que viver com ele? Se quer um lago, eu passo ao largo, se quer um rio, sorrio. Mas quem manda é eu. Entendeu? O resto é conversa de Prometeu mas não cumpriu.
Puta que pariu, ele sumiu! E eu? Fodeu!