quarta-feira, 23 de julho de 2008

Ensaio sobre a cegueira

Foto: Sebastião Salgado

A Lucidez Perigosa
Clarice Lispector

Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.
 
Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
- já me aconteceu antes.
 
Pois sei que
- em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade
- essa clareza de realidade
é um risco.
 
Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve
para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.

Obrigado, Cláudia

Um comentário:

  1. Vou comentar por meio dela mesma:

    Apagai, pois, minha flama, Deus,
    porque ela não me serve
    para viver os dias.
    Ajudai-me a de novo consistir
    dos modos possíveis.
    Eu consisto,
    eu consisto,
    amém.

    Grande que tenha nos trazido Clarice à lembrança.

    Um beijo meu amigo,

    Meire

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